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Em um dos clássicos da música contemporânea, o hoje relativamente obscuro Edwin Starr cantou um mantra inesquecível, mais grudento que cola Super Bonder: "War, what is it good for? Absolutely nothing!" ("Guerra, para que serve? Absolutamente nada!"). A música foi regravada por vários artistas ao longo dos anos, mas a interpretação original talvez seja ainda a melhor.



Fica difícil tirar o refrão dessa música da cabeça ao escrever sobre o BNDES. Afinal, para que serve?
A justificativa padrão para um banco de desenvolvimento estatal é oferecer financiamentos para projetos viáveis que não seriam financiados pelo setor privado. Por exemplo, planos de empresas pequenas ou inovadoras que carregam benefício social, mas que são considerados arriscados demais ou pouco lucrativos pelo setor privado. Ou grandes projetos que um setor privado raquítico não teria condições de financiar sozinho.

As duas justificativas, no caso do Brasil, não se aplicam ao BNDES.

Primeiro, a carteira do BNDES é bem mais direcionada a grandes empresas do que a carteira dos maiores bancos privados no Brasil. Entre 60% e 70% dos desembolsos do banco nos últimos anos foram voltados a esse público. São, por exemplo, as grandes construtoras e os frigoríficos que vão ao BNDES para se financiar.

Segundo, grandes empresas brasileiras são perfeitamente capazes de mobilizar recursos para projetos igualmente grandiosos. Uma das maiores emissões de títulos de dívida de todos os tempos foi feita pela Petrobras. Não há motivo algum para imaginar que falta de financiamento a preço de mercado seja um empecilho. Para financiar projetos de alto benefício social, é mais barato, transparente e democrático oferecer o subsídio diretamente pelo Tesouro, passando pelo Orçamento. Para isso, portanto, um banco de desenvolvimento estatal é apenas um intermediário desnecessário.

Mas o BNDES serve, sim, para objetivos espúrios ou particularistas.

Os empréstimos do BNDES são moeda de troca para políticos em busca do apoio de grandes empresários. A JBS se locupletou com empréstimos injustificáveis enquanto era a companhia que mais doava dinheiro para campanhas políticas. Nenhuma surpresa aqui: os empréstimos do BNDES à JBS eram uma forma de transferir renda do contribuinte e do usuário de serviços públicos para aquela companhia. E tudo isso a um alto custo, já que seus funcionários são extremamente bem pagos.

A medida provisória 777 visa reduzir o dano causado pelo BNDES. Ela limita a sua capacidade de agir como Robin Hood às avessas, que tira dos pobres e dá aos ricos. Mas é insuficiente. Assim como um governo pode editar uma MP limitando a própria capacidade de causar dano, amanhã podemos mudar as regras e rever o BNDES expandindo a "bolsa empresário".

Enquanto o BNDES existir, políticos malandros vão sentir aquela coceirinha para transferir riqueza para os ricos.

Já está na hora de termos uma conversa franca. Entre todos os países emergentes, estamos entre aqueles que menos crescem - e não é de hoje, mas nos últimos 30 anos. Provavelmente, somos também o emergente com o maior banco de desenvolvimento. Não é coincidência. O BNDES é caro e não contribui para o desenvolvimento do Brasil.

O que podemos fazer para mudar? A melhor alternativa é fechar gradualmente o monstrengo. Reduzir sua carteira de ativos e sua força de trabalho.

Seria uma mudança radical? Seria. Empresários acostumados a mamar em suas tetas esperneariam como crianças que perderam o brinquedo. Entre seus funcionários, muitos encontrariam emprego no setor privado concedendo crédito, mas, certamente, haveria quem se juntasse ao esperneio dos empresários mamadores. Afinal, se fecharmos o BNDES, muitos perderiam salários muito acima do que poderiam obter no mercado privado e, eventualmente, teriam que vender seus apartamentos no Leblon e tentar reencontrar a felicidade em Copacabana. Mas por uma boa causa: sobrariam mais recursos públicos para fins nobres, como expandir a rede de esgotos, melhorar a escola pública ou dar apoio às famílias tocadas pela zika.

Na falta de liderança política para enfrentar a choradeira do andar de cima, há alternativas mais suaves. Um mandato para reduzir o balanço patrimonial do BNDES, saindo gradualmente dos investimentos em ações e diminuindo a exposição a grandes empresas, seria bem-vindo. Buscar a maior parte de seu financiamento em mercados de capitais privados traria mais disciplina. Também seria bem-vinda uma política salarial que não se assemelhe a um assalto aos cofres públicos. Para evitar a tentação de distribuir dinheiro aos ricos, o capital do BNDES poderia ser comprometido legalmente com o financiamento do saneamento básico (um gasto pró-pobre) ou empréstimos estudantis, quiçá com subsídio transparente vindo do Tesouro.

Daí, talvez, tiremos aquela música incômoda da cabeça:

"BNDES! Para que serve? Absolutamente nada!"

 

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Para que serve o BNDES?

Em um dos clássicos da música contemporânea, o hoje relativamente obscuro Edwin Starr cantou um mantra inesquecível, mais grudento que cola Super Bonder: "War, what is it good for? Absolutely nothing!" ("Guerra, para que serve? Absolutamente nada!"). A música foi regravada por vários artistas ao longo dos anos, mas a interpretação original talvez seja ainda a melhor.



Fica difícil tirar o refrão dessa música da cabeça ao escrever sobre o BNDES. Afinal, para que serve?
A justificativa padrão para um banco de desenvolvimento estatal é oferecer financiamentos para projetos viáveis que não seriam financiados pelo setor privado. Por exemplo, planos de empresas pequenas ou inovadoras que carregam benefício social, mas que são considerados arriscados demais ou pouco lucrativos pelo setor privado. Ou grandes projetos que um setor privado raquítico não teria condições de financiar sozinho.

As duas justificativas, no caso do Brasil, não se aplicam ao BNDES.

Primeiro, a carteira do BNDES é bem mais direcionada a grandes empresas do que a carteira dos maiores bancos privados no Brasil. Entre 60% e 70% dos desembolsos do banco nos últimos anos foram voltados a esse público. São, por exemplo, as grandes construtoras e os frigoríficos que vão ao BNDES para se financiar.

Segundo, grandes empresas brasileiras são perfeitamente capazes de mobilizar recursos para projetos igualmente grandiosos. Uma das maiores emissões de títulos de dívida de todos os tempos foi feita pela Petrobras. Não há motivo algum para imaginar que falta de financiamento a preço de mercado seja um empecilho. Para financiar projetos de alto benefício social, é mais barato, transparente e democrático oferecer o subsídio diretamente pelo Tesouro, passando pelo Orçamento. Para isso, portanto, um banco de desenvolvimento estatal é apenas um intermediário desnecessário.

Mas o BNDES serve, sim, para objetivos espúrios ou particularistas.

Os empréstimos do BNDES são moeda de troca para políticos em busca do apoio de grandes empresários. A JBS se locupletou com empréstimos injustificáveis enquanto era a companhia que mais doava dinheiro para campanhas políticas. Nenhuma surpresa aqui: os empréstimos do BNDES à JBS eram uma forma de transferir renda do contribuinte e do usuário de serviços públicos para aquela companhia. E tudo isso a um alto custo, já que seus funcionários são extremamente bem pagos.

A medida provisória 777 visa reduzir o dano causado pelo BNDES. Ela limita a sua capacidade de agir como Robin Hood às avessas, que tira dos pobres e dá aos ricos. Mas é insuficiente. Assim como um governo pode editar uma MP limitando a própria capacidade de causar dano, amanhã podemos mudar as regras e rever o BNDES expandindo a "bolsa empresário".

Enquanto o BNDES existir, políticos malandros vão sentir aquela coceirinha para transferir riqueza para os ricos.

Já está na hora de termos uma conversa franca. Entre todos os países emergentes, estamos entre aqueles que menos crescem - e não é de hoje, mas nos últimos 30 anos. Provavelmente, somos também o emergente com o maior banco de desenvolvimento. Não é coincidência. O BNDES é caro e não contribui para o desenvolvimento do Brasil.

O que podemos fazer para mudar? A melhor alternativa é fechar gradualmente o monstrengo. Reduzir sua carteira de ativos e sua força de trabalho.

Seria uma mudança radical? Seria. Empresários acostumados a mamar em suas tetas esperneariam como crianças que perderam o brinquedo. Entre seus funcionários, muitos encontrariam emprego no setor privado concedendo crédito, mas, certamente, haveria quem se juntasse ao esperneio dos empresários mamadores. Afinal, se fecharmos o BNDES, muitos perderiam salários muito acima do que poderiam obter no mercado privado e, eventualmente, teriam que vender seus apartamentos no Leblon e tentar reencontrar a felicidade em Copacabana. Mas por uma boa causa: sobrariam mais recursos públicos para fins nobres, como expandir a rede de esgotos, melhorar a escola pública ou dar apoio às famílias tocadas pela zika.

Na falta de liderança política para enfrentar a choradeira do andar de cima, há alternativas mais suaves. Um mandato para reduzir o balanço patrimonial do BNDES, saindo gradualmente dos investimentos em ações e diminuindo a exposição a grandes empresas, seria bem-vindo. Buscar a maior parte de seu financiamento em mercados de capitais privados traria mais disciplina. Também seria bem-vinda uma política salarial que não se assemelhe a um assalto aos cofres públicos. Para evitar a tentação de distribuir dinheiro aos ricos, o capital do BNDES poderia ser comprometido legalmente com o financiamento do saneamento básico (um gasto pró-pobre) ou empréstimos estudantis, quiçá com subsídio transparente vindo do Tesouro.

Daí, talvez, tiremos aquela música incômoda da cabeça:

"BNDES! Para que serve? Absolutamente nada!"

 
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