Uma plataforma que vai te ajudar a entender um pouco mais de economia.

							Impossível ignorar as evidências alarmantes sobre os marcadores dos limites planetários. O conceito de limites planetários foi proposto por um grupo internacional de cientistas, liderado pelo sueco Johan Rockström, do Centro de Resiliência de Estocolmo, que mensurou o risco que corremos ao quebrar o equilíbrio natural e a capacidade de resiliência da Terra. Os cientistas propuseram 9 marcadores de fronteiras ambientais seguras relacionados aos impactos das atividades humanas nos ecossistemas planetários. Estimativas atuais indicam que 6 limites – mudanças climáticas, perda de biodiversidade, fluxo biogeoquímico, poluição plástica e mudanças no uso da água doce – já foram ultrapassados.

A manutenção dos limites planetários em zonas seguras para a sobrevivência na Terra pressupõe investimentos em inovação. Em um país onde menos de 1% do PIB é direcionado para investimento público em inovação, como é o caso do Brasil, o papel das organizações se torna ainda mais relevante para tratar problemas críticos da nossa sociedade. Na prática, as estratégias organizacionais que visam a geração de valor compartilhado dependem da inovação orientada para a sustentabilidade (IOS). A IOS envolve a realização de mudanças intencionais em produtos, serviços, processos e modelos de negócios a fim de gerar benefícios ambientais e sociais perenes, além de, ao mesmo tempo, retorno financeiro para o negócio.

Em geral, a IOS incorpora no processo de inovação questões relacionadas a clima, resíduos e poluição, direitos humanos, diversidade, inclusão, entre outros objetivos globais de sustentabilidade. O potencial de geração de valor compartilhado é significativo. Um estudo recente do WRI Brasil indica que práticas sustentáveis e de baixo carbono podem gerar um crescimento significativo do PIB, com ganho total acumulado de R$ 2,8 trilhões até 2030 em relação ao business as usual.

São vários os exemplos de IOS em novos modelos de negócios sociais ou de impacto, como é o caso da Pantys e da VerBem. A Pantys é uma empresa B brasileira que desenvolveu uma calcinha absorvente reutilizável. A ideia por trás do produto é combinar tecnologia, sustentabilidade e design em prol do conforto e da saúde da mulher durante seus ciclos menstruais. As peças têm tecido biodegradável e antimicrobiano com bloqueador de odores, alta capacidade de absorção e durabilidade de dois anos (50 lavagens). O uso de Pantys reduz em 1 ano o uso de 400 absorventes descartáveis, que equivalem a uma economia anual de R$ 300 e 4.000 g de lixo. A Pantys também tem um posicionamento que remete a liberdade e empoderamento das mulheres e combate à pobreza menstrual por meio do programa de doações de calcinhas, que envolve publicações no Instagram e a ação ativa das consumidoras. As duas empreendedoras que fundaram a Pantys já foram reconhecidas no Brasil e no mundo pelos impactos positivos gerados pela inovação do modelo de negócio e produto.

A VerBem é uma ótica não convencional que tem como principal objetivo tornar o mercado óptico mais acessível e democrático sem perder em estilo e qualidade. Eles oferecem o modelo GoodVisionGlasses (baixo custo) e também óculos convencionais a preços competitivos. Além disso, a marca consegue doar óculos para quem não pode comprar, por meio da ONG Renovatio. A Renovatio viaja o Brasil, nos lugares mais distantes, com ônibus adaptados, carretas e vans, levando atendimentos oftalmológicos gratuitos e doações de óculos de grau para pessoas em situação de vulnerabilidade social. Em 2021 era a maior ONG de consulta oftalmológica do Brasil, com mais de 200 mil atendimentos em 23 estados do país. A VerBem já enviou cerca de 60 mil óculos de grau para países como Moçambique, Haiti e Índia.

A IOS em negócios tradicionais também tem gerado vários impactos positivos. A Ambev, por exemplo, tem realizado vários ajustes em seu processo de produção e gestão da cadeia de suprimentos para ter uma operação ecoeficiente. A empresa investiu em gestão de recursos hídricos, gestão energética, de resíduos e logística reversa. No caso da água, os dados publicados pela empresa nos relatórios de sustentabilidade mostram que em 2020 o consumo foi 4,7% menor que em 2019. Comparado com o consumo de água em 2002, a redução foi de 55%. A empresa também antecipou a meta de eficiência hídrica definida para 2025 e já alcançou a média de 2,5 litros de água para cada litro de cerveja produzido, o que no passado era algo em torno de 5 litros de água para cada litro de bebida. Uma das principais inovações para melhorar o índice de economia de água foi a instalação de medidores em todas as etapas do processo produtivo, o que possibilita analisar os indicadores para cada uma das fases. Outra ação eficaz para economia de água é a padronização de processos e a replicação de boas práticas que surgem por iniciativa dos próprios funcionários.

Esses três exemplos de inovação no contexto de negócios só são possíveis porque os gestores desenvolvem e aplicam pensamento sistêmico com base em uso de evidências robustas na tomada de decisões e investem em ecossistemas de inovação. O pensamento sistêmico pressupõe que partes de um sistema podem ser melhor entendidas no contexto de suas relações entre si. Isso é relevante, uma vez que os sistemas naturais e sociais estão cada vez mais interconectados e qualquer mudança em um deles pode causar um ponto crítico em outro. As mudanças climáticas, por exemplo, afetam a quantidade e severidade das chuvas e inundações, o que pode gerar deslizamentos e mortes em bairros de periferia em centros urbanos. É necessário compreender de forma mais ampla todo o sistema do qual a organização faz parte – incluindo outras empresas, o meio ambiente, fornecedores, competidores, comunidades do entorno, governos, pesquisadores e universidades.

Como fazer a IOS em escala global? É possível reverter limites planetários em zonas críticas por meio de IOS? Atualmente, pesquisadores argumentam que o único limite seguro é o da camada de ozônio. Para quem não se lembra ou não conhece a história, em 1985 a camada de ozônio teve seu marcador de limite seguro ultrapassado. Cientistas descobriram um buraco na camada de ozônio na Antártica e chamaram atenção para a necessidade de uma ação efetiva a fim de evitarmos uma catástrofe global. Para deter o avanço do buraco, diferentes países concordaram em banir o uso dos gases clorofluorcarbonetos (CFC). O acordo foi formalizado na Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio em 1985 e no Protocolo de Montreal em 1987. Além da governança global restritiva, foi graças a ciência e inovação no setor químico, em especial nos setores de refrigeração e ar-condicionado, que conseguimos banir eficientemente o gás CFC do mercado sem causar uma grande perda econômica para setores e empresas.

Essa história de sucesso mostra que é possível resolver problemas complexos da sociedade por meio de pensamento sistêmico, colaboração e IOS. A ajuda não virá de outro planeta. Se o desenvolvimento econômico for fundamentado em IOS com foco em energia renovável, proteção florestal, agricultura regenerativa, soluções baseadas na natureza, inclusão social e afins, será possível aumentar os empregos, a renda, reduzir desigualdade, melhorar saúde e bem-estar. Com isso teremos mais tempo para viver em harmonia com a natureza e com nossos entes queridos.

Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência. Em julho, colunistas da Folha de S. Paulo cedem seus espaços para refletir sobre o papel da ciência na reconstrução do Brasil.


COLUNA PUBLICADA NA FOLHA DE S.PAULO 

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A importância da inovação para a retomada verde

Impossível ignorar as evidências alarmantes sobre os marcadores dos limites planetários. O conceito de limites planetários foi proposto por um grupo internacional de cientistas, liderado pelo sueco Johan Rockström, do Centro de Resiliência de Estocolmo, que mensurou o risco que corremos ao quebrar o equilíbrio natural e a capacidade de resiliência da Terra. Os cientistas propuseram 9 marcadores de fronteiras ambientais seguras relacionados aos impactos das atividades humanas nos ecossistemas planetários. Estimativas atuais indicam que 6 limites – mudanças climáticas, perda de biodiversidade, fluxo biogeoquímico, poluição plástica e mudanças no uso da água doce – já foram ultrapassados.

A manutenção dos limites planetários em zonas seguras para a sobrevivência na Terra pressupõe investimentos em inovação. Em um país onde menos de 1% do PIB é direcionado para investimento público em inovação, como é o caso do Brasil, o papel das organizações se torna ainda mais relevante para tratar problemas críticos da nossa sociedade. Na prática, as estratégias organizacionais que visam a geração de valor compartilhado dependem da inovação orientada para a sustentabilidade (IOS). A IOS envolve a realização de mudanças intencionais em produtos, serviços, processos e modelos de negócios a fim de gerar benefícios ambientais e sociais perenes, além de, ao mesmo tempo, retorno financeiro para o negócio.

Em geral, a IOS incorpora no processo de inovação questões relacionadas a clima, resíduos e poluição, direitos humanos, diversidade, inclusão, entre outros objetivos globais de sustentabilidade. O potencial de geração de valor compartilhado é significativo. Um estudo recente do WRI Brasil indica que práticas sustentáveis e de baixo carbono podem gerar um crescimento significativo do PIB, com ganho total acumulado de R$ 2,8 trilhões até 2030 em relação ao business as usual.

São vários os exemplos de IOS em novos modelos de negócios sociais ou de impacto, como é o caso da Pantys e da VerBem. A Pantys é uma empresa B brasileira que desenvolveu uma calcinha absorvente reutilizável. A ideia por trás do produto é combinar tecnologia, sustentabilidade e design em prol do conforto e da saúde da mulher durante seus ciclos menstruais. As peças têm tecido biodegradável e antimicrobiano com bloqueador de odores, alta capacidade de absorção e durabilidade de dois anos (50 lavagens). O uso de Pantys reduz em 1 ano o uso de 400 absorventes descartáveis, que equivalem a uma economia anual de R$ 300 e 4.000 g de lixo. A Pantys também tem um posicionamento que remete a liberdade e empoderamento das mulheres e combate à pobreza menstrual por meio do programa de doações de calcinhas, que envolve publicações no Instagram e a ação ativa das consumidoras. As duas empreendedoras que fundaram a Pantys já foram reconhecidas no Brasil e no mundo pelos impactos positivos gerados pela inovação do modelo de negócio e produto.

A VerBem é uma ótica não convencional que tem como principal objetivo tornar o mercado óptico mais acessível e democrático sem perder em estilo e qualidade. Eles oferecem o modelo GoodVisionGlasses (baixo custo) e também óculos convencionais a preços competitivos. Além disso, a marca consegue doar óculos para quem não pode comprar, por meio da ONG Renovatio. A Renovatio viaja o Brasil, nos lugares mais distantes, com ônibus adaptados, carretas e vans, levando atendimentos oftalmológicos gratuitos e doações de óculos de grau para pessoas em situação de vulnerabilidade social. Em 2021 era a maior ONG de consulta oftalmológica do Brasil, com mais de 200 mil atendimentos em 23 estados do país. A VerBem já enviou cerca de 60 mil óculos de grau para países como Moçambique, Haiti e Índia.

A IOS em negócios tradicionais também tem gerado vários impactos positivos. A Ambev, por exemplo, tem realizado vários ajustes em seu processo de produção e gestão da cadeia de suprimentos para ter uma operação ecoeficiente. A empresa investiu em gestão de recursos hídricos, gestão energética, de resíduos e logística reversa. No caso da água, os dados publicados pela empresa nos relatórios de sustentabilidade mostram que em 2020 o consumo foi 4,7% menor que em 2019. Comparado com o consumo de água em 2002, a redução foi de 55%. A empresa também antecipou a meta de eficiência hídrica definida para 2025 e já alcançou a média de 2,5 litros de água para cada litro de cerveja produzido, o que no passado era algo em torno de 5 litros de água para cada litro de bebida. Uma das principais inovações para melhorar o índice de economia de água foi a instalação de medidores em todas as etapas do processo produtivo, o que possibilita analisar os indicadores para cada uma das fases. Outra ação eficaz para economia de água é a padronização de processos e a replicação de boas práticas que surgem por iniciativa dos próprios funcionários.

Esses três exemplos de inovação no contexto de negócios só são possíveis porque os gestores desenvolvem e aplicam pensamento sistêmico com base em uso de evidências robustas na tomada de decisões e investem em ecossistemas de inovação. O pensamento sistêmico pressupõe que partes de um sistema podem ser melhor entendidas no contexto de suas relações entre si. Isso é relevante, uma vez que os sistemas naturais e sociais estão cada vez mais interconectados e qualquer mudança em um deles pode causar um ponto crítico em outro. As mudanças climáticas, por exemplo, afetam a quantidade e severidade das chuvas e inundações, o que pode gerar deslizamentos e mortes em bairros de periferia em centros urbanos. É necessário compreender de forma mais ampla todo o sistema do qual a organização faz parte – incluindo outras empresas, o meio ambiente, fornecedores, competidores, comunidades do entorno, governos, pesquisadores e universidades.

Como fazer a IOS em escala global? É possível reverter limites planetários em zonas críticas por meio de IOS? Atualmente, pesquisadores argumentam que o único limite seguro é o da camada de ozônio. Para quem não se lembra ou não conhece a história, em 1985 a camada de ozônio teve seu marcador de limite seguro ultrapassado. Cientistas descobriram um buraco na camada de ozônio na Antártica e chamaram atenção para a necessidade de uma ação efetiva a fim de evitarmos uma catástrofe global. Para deter o avanço do buraco, diferentes países concordaram em banir o uso dos gases clorofluorcarbonetos (CFC). O acordo foi formalizado na Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio em 1985 e no Protocolo de Montreal em 1987. Além da governança global restritiva, foi graças a ciência e inovação no setor químico, em especial nos setores de refrigeração e ar-condicionado, que conseguimos banir eficientemente o gás CFC do mercado sem causar uma grande perda econômica para setores e empresas.

Essa história de sucesso mostra que é possível resolver problemas complexos da sociedade por meio de pensamento sistêmico, colaboração e IOS. A ajuda não virá de outro planeta. Se o desenvolvimento econômico for fundamentado em IOS com foco em energia renovável, proteção florestal, agricultura regenerativa, soluções baseadas na natureza, inclusão social e afins, será possível aumentar os empregos, a renda, reduzir desigualdade, melhorar saúde e bem-estar. Com isso teremos mais tempo para viver em harmonia com a natureza e com nossos entes queridos.

Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência. Em julho, colunistas da Folha de S. Paulo cedem seus espaços para refletir sobre o papel da ciência na reconstrução do Brasil.


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