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Depois de 20 anos de negociação, Mercosul e União Europeia firmaram um acordo de livre-comércio. Ainda não temos muitos detalhes, mas trata-se de um acordo bastante amplo, que zera tarifas de importação para uma extensa gama de produtos. Demorará ainda um tempo para entrar em vigor, especialmente pela necessidade de aprovação no Parlamento Europeu e dos países sul-americanos envolvidos. Além disso, a redução das barreiras será gradual.

Os grandes beneficiários do acordo são os consumidores, de ambos os lados do oceano. Comércio aumenta competição, com produtores tendo de baixar preços, melhorar a qualidade de seus produtos e oferecer maior variedade. Para os produtores já estabelecidos, que gozam de mercados mais cativos, a notícia certamente não é boa. Algumas empresas fecharão as portas com a competição. Outras, por outro lado, crescerão com as oportunidades de exportação.

Uma preocupação recorrente no Brasil é o impacto sobre a indústria – boa parte da qual sofrerá com a competição dos parceiros europeus, que tendem a ser bem mais eficientes. Esse argumento não é descabido, já que a indústria é vista habitualmente como o setor mais dinâmico, em que os ganhos de produtividade são mais intensos. A entrada de produtos da União Europeia em nosso mercado pode levar a um encolhimento da indústria local, deslocando fatores de produção (como mão de obra, capital etc.) para outros setores, que não são tão produtivos. A produtividade da economia como um todo se reduziria com essa nova configuração setorial.

No entanto, a baixa produtividade brasileira é algo que se estende por diversos setores da atividade – inclusive a indústria. Uma mudança estrutural, concentrando fatores de produção em setores mais eficientes, geraria pouco ganho em termos de produtividade agregada. Políticas que privilegiem determinados setores em detrimento de outros, dessa forma, trariam pouco retorno em termos de produtividade agregada.

Além disso, podem engendrar uma série de custos, pelos aspectos de economia política envolvidos. Em um ambiente no qual o governo privilegia setores, diversos deles argumentarão que são especiais, que precisam de proteção do governo. Para consegui-la, passam a investir em lobby e na construção de conexões pessoais com políticos. Em outras palavras, seu incentivo é buscar esses contatos, em vez de melhorar produtos ou adotar técnicas mais modernas e assim por diante. Além disso, os empresários de sucesso serão os que têm mais proximidade com o governo, e não necessariamente os mais eficientes. Tudo isso contribui para minar a produtividade agregada – e não aumentá-la.

A abertura ao comércio tem outros potenciais efeitos que podem ajudar a aumentar a produtividade. Em primeiro lugar, há seleção positiva de empresas: as firmas menos produtivas deixam o mercado em face da competição mais dura; e as que conseguem exportar para o concorrido mercado europeu (e que crescerão como resultado) tendem a ser relativamente eficientes.

Em segundo lugar, mercados fechados como o nosso fazem com que produtores não precisem inovar ou buscar técnicas mais modernas com tanto afinco, exatamente pela falta de competidores. A abertura coloca pressão sobre as empresas estabelecidas, que precisarão melhorar seu jogo para continuar operando. Em terceiro lugar, empresas locais passam a ter acesso a insumos diferenciados e máquinas mais modernas provenientes de fora, o que contribui para elevar sua produtividade.

Por fim – e talvez o fator mais importante para um país com instituições não tão fortes como o nosso –, a entrada em um acordo desse porte atua como mecanismo de comprometimento do país com políticas mais abertas ao comércio. Uma vez sacramentado o acordo, uma futura saída seria algo extremamente custoso, o que diminuiria a incidência de políticas que beneficiassem um setor ou empresa específica. Empresários entenderiam, dessa forma, que o jogo mudou e o investimento em conexões políticas tem pouco retorno, buscando dessa forma alternativas (como ganhar eficiência) para aumentar seus lucros. O lado da economia política ficaria bem menos complicado.

Tudo isso gera maior previsibilidade nas políticas comerciais (e compromisso de longo prazo com um país mais aberto), o que pode facilitar inclusive a assinatura de acordos com outros países.

PUBLICADO NA FOLHA DE S. PAULO

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Como o acordo Mercosul-União Europeia pode beneficiar a economia brasileira?

Depois de 20 anos de negociação, Mercosul e União Europeia firmaram um acordo de livre-comércio. Ainda não temos muitos detalhes, mas trata-se de um acordo bastante amplo, que zera tarifas de importação para uma extensa gama de produtos. Demorará ainda um tempo para entrar em vigor, especialmente pela necessidade de aprovação no Parlamento Europeu e dos países sul-americanos envolvidos. Além disso, a redução das barreiras será gradual. Os grandes beneficiários do acordo são os consumidores, de ambos os lados do oceano. Comércio aumenta competição, com produtores tendo de baixar preços, melhorar a qualidade de seus produtos e oferecer maior variedade. Para os produtores já estabelecidos, que gozam de mercados mais cativos, a notícia certamente não é boa. Algumas empresas fecharão as portas com a competição. Outras, por outro lado, crescerão com as oportunidades de exportação. Uma preocupação recorrente no Brasil é o impacto sobre a indústria – boa parte da qual sofrerá com a competição dos parceiros europeus, que tendem a ser bem mais eficientes. Esse argumento não é descabido, já que a indústria é vista habitualmente como o setor mais dinâmico, em que os ganhos de produtividade são mais intensos. A entrada de produtos da União Europeia em nosso mercado pode levar a um encolhimento da indústria local, deslocando fatores de produção (como mão de obra, capital etc.) para outros setores, que não são tão produtivos. A produtividade da economia como um todo se reduziria com essa nova configuração setorial. No entanto, a baixa produtividade brasileira é algo que se estende por diversos setores da atividade – inclusive a indústria. Uma mudança estrutural, concentrando fatores de produção em setores mais eficientes, geraria pouco ganho em termos de produtividade agregada. Políticas que privilegiem determinados setores em detrimento de outros, dessa forma, trariam pouco retorno em termos de produtividade agregada. Além disso, podem engendrar uma série de custos, pelos aspectos de economia política envolvidos. Em um ambiente no qual o governo privilegia setores, diversos deles argumentarão que são especiais, que precisam de proteção do governo. Para consegui-la, passam a investir em lobby e na construção de conexões pessoais com políticos. Em outras palavras, seu incentivo é buscar esses contatos, em vez de melhorar produtos ou adotar técnicas mais modernas e assim por diante. Além disso, os empresários de sucesso serão os que têm mais proximidade com o governo, e não necessariamente os mais eficientes. Tudo isso contribui para minar a produtividade agregada – e não aumentá-la. A abertura ao comércio tem outros potenciais efeitos que podem ajudar a aumentar a produtividade. Em primeiro lugar, há seleção positiva de empresas: as firmas menos produtivas deixam o mercado em face da competição mais dura; e as que conseguem exportar para o concorrido mercado europeu (e que crescerão como resultado) tendem a ser relativamente eficientes. Em segundo lugar, mercados fechados como o nosso fazem com que produtores não precisem inovar ou buscar técnicas mais modernas com tanto afinco, exatamente pela falta de competidores. A abertura coloca pressão sobre as empresas estabelecidas, que precisarão melhorar seu jogo para continuar operando. Em terceiro lugar, empresas locais passam a ter acesso a insumos diferenciados e máquinas mais modernas provenientes de fora, o que contribui para elevar sua produtividade. Por fim – e talvez o fator mais importante para um país com instituições não tão fortes como o nosso –, a entrada em um acordo desse porte atua como mecanismo de comprometimento do país com políticas mais abertas ao comércio. Uma vez sacramentado o acordo, uma futura saída seria algo extremamente custoso, o que diminuiria a incidência de políticas que beneficiassem um setor ou empresa específica. Empresários entenderiam, dessa forma, que o jogo mudou e o investimento em conexões políticas tem pouco retorno, buscando dessa forma alternativas (como ganhar eficiência) para aumentar seus lucros. O lado da economia política ficaria bem menos complicado. Tudo isso gera maior previsibilidade nas políticas comerciais (e compromisso de longo prazo com um país mais aberto), o que pode facilitar inclusive a assinatura de acordos com outros países. PUBLICADO NA FOLHA DE S. PAULO Para ficar por dentro do que rola no Por Quê?, clique aqui e assine a nossa Newsletter.
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