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Intervenções urbanas frequentemente afetam o meio ambiente. Ocupação de áreas de manancial (onde há fonte de água limpa subterrânea ou superficial), destruição de áreas verdes para empreendimentos e outras coisas do tipo trazem consequências para o bem-estar da população de toda uma região.

Mas não é tão óbvio que essas intervenções sejam ruins. Depende dos detalhes de cada caso em particular.

Por exemplo, construir habitações em áreas de mananciais prejudica a qualidade da água, o que é um aspecto negativo. Dificilmente algum urbanista vai defender isso. Mesmo que seja para a habitação social. A água passou a ser ponto critico no planejamento das cidades e, por isso, defende-se não só a proteção irrestrita dos mananciais, mas também dos entornos de rios e afluentes.

O caso de Nova Iorque é símbolo da gravidade da questão: donos de terras próximas aos rios que abastecem os cidadãos, em alguns casos a 150 quilômetros de distância, recebem grana para que preservem matas e terras do entorno. A conta feita é simples: diminui o custo do tratamento da água, que é bem mais caro.

Para quem defende a medida, essa ocupação dos mananciais pode abrir novo espaço para as pessoas se instalarem. E, para esses indivíduos, a medida é boa – e isso não pode ficar fora do cálculo do gestor público quando decide, ou não, por alguma medida desse naipe.

Do ponto de vista econômico, talvez o mais importante nesta discussão seja: há efeitos distributivos nada desprezíveis em ocupar áreas de mananciais. E é aí que mora o perigo.

“Efeitos distributivos”? Como assim? Por quê?

Vamos lá.

Os beneficiários dessas ações geralmente são poucos e o ganho individual, ou seja, para cada um deles, é grande.

Pense, por exemplo, nas pessoas que se instalam em uma área de manancial. Elas passam a ter uma opção a mais de local para morar, o que é um ganho individualmente elevado para essas pessoas.

Por outro lado, esse fator tende a prejudicar a qualidade da água. E esse prejuízo não afeta apenas o local em que o indivíduo passa a morar. Interfere na vida de um sem fim de pessoas que precisam da água dos mananciais para viver.

Em outras palavras, o custo de fazer residências em áreas de mananciais é compartilhado por um grupo volumoso de pessoas – ainda que esse grupo volumoso não se dê conta disso.

Dessa forma, a política de ocupar áreas de manancial é muito favorável a quem passa a morar nessas áreas. O ganho é basicamente privado, mas o custo é socializado com um monte de gente. Os cidadãos beneficiados, assim, têm todo o incentivo do mundo a pressionar governantes para que a política da ocupação de mananciais vá em frente.

Como, em geral, os beneficiários são poucos e com interesses comuns, eles têm facilidade para pressionar políticos de maneira organizada.

Mas e a situação de quem perde com isso? Como fica para quem não tem acesso a um novo local para morar, mas que arca com o custo da água de pior qualidade?

Como as pessoas afetadas formam um grande grupo que reúne interesses bastante diversos, essa gente tem mais dificuldade para se organizar contra medidas que lhes sejam prejudiciais.

A vantagem, assim, é toda dos beneficiários da política. E ela tem grandes chances de entrar em vigor por causa dessas condições.

Digamos que uma área de mananciais seja ocupada. Saber se, na prática, essa medida será boa ou ruim (ou seja, se a soma dos ganhos da sociedade será maior ou menor que as perdas) depende do contexto e da política específica de que estamos tratando. Mas mesmo políticas ruins podem vigorar por causa desse problema distributivo discutido acima: ganhos ficam concentrados em um grupo pequeno e homogêneo; e perdas são espalhadas em um grupo grande e heterogêneo.

E esse problema distributivo não se aplica apenas para questões ambientais. O Brasil é repleto de casos de políticas claramente equivocadas que beneficiam somente pequeno grupo, em detrimento da população como um todo. E essas políticas não morrem facilmente justamente pelo poder de organização de poucas pessoas, maior que o de muitas.

Por essas razões, precisamos estar informados sobre os reais impactos que políticas sociais e econômicas têm na sociedade. Dessa forma, podemos pressionar governantes a não cometerem “barbeiragens” que sejam prejudiciais a uma maioria silenciosa.


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