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Por Sérgio Lazzarini*

Vários setores da economia, no Brasil e no exterior, são regulados por agências responsáveis por monitorar o desempenho das firmas e o comportamento dos preços. A Anatel e a Aneel, por exemplo, regulam os setores de telecomunicações e energia no Brasil.

Mas de onde vêm esses reguladores? Por que não é o próprio governante, eleito pela população, o dono da voz sobre o que deve ser feito e o que é mais adequado em cada setor?

Vejamos um caso.

Logo após ter assumido a Presidência, em fevereiro de 2003, Lula recebeu a notícia (segundo ele, pelos jornais) que determinadas agências haviam autorizado aumentos de tarifas. Encarecer serviços pagos diretamente pela população não é algo que particularmente pega bem para um governante. Contrariado, disse que as agências estavam “mandando no país”.

A sua ministra de Minas e Energia à época, ninguém menos que Dilma Rousseff, passou a pedir para sua agência, a Aneel, “tarifas módicas”.

De lá para cá, muitas das agências reguladoras no Brasil foram enfraquecidas, sendo progressivamente transformadas em oportunidade de emprego para aliados políticos e recorrentemente postas de lado pelo governo em decisões importantes.

Em 2012, já eleita presidente, Dilma seguiu com sua ideia de tarifas módicas e forçou uma redução do preço da energia elétrica em troca de renovação antecipada de algumas concessões no setor. Alguns técnicos da própria Aneel se manifestaram contrários a essa intervenção, mas não foram ouvidos na decisão final.

Parece, a princípio, natural que o governante deva buscar menores preços e tarifas para a população. Mas isso tem um efeito colateral perverso.

As empresas investem quando vislumbram um cenário mais estável e que as permita lucrar. Quando o governo em exercício faz intervenções ao seu bel prazer, não somente tende a reduzir a rentabilidade dos projetos privados como também aumenta o risco percebido pelos empresários. No limite, eles param de investir.

É exatamente o que estamos presenciando no Brasil agora.

Como mudar isso?

O remédio, absolutamente urgente, é reconstruir as agências reguladoras no Brasil, dotando-as de especialistas com mandato claro e critérios técnicos em vez de políticos. Esses especialistas devem ter força suficiente para servir de contraponto a governantes que repentinamente queiram mandar no setor.
Por lei, são os senadores os responsáveis por autorizar o apontamento dos gestores das agências. Um projeto em discussão, de autoria do senador Ricardo Ferraço, vai um pouco além: propõe não apenas requisitos técnicos para o apontamento dos dirigentes das agências, como também um mecanismo de pré-arguição dos candidatos, em sessão aberta ao público.

Muitos, corretamente, perguntarão:

– Mas quem regula o regulador? O que garante que esses técnicos irão fazer as melhores escolhas?

Não se trata de questão trivial. Dilema similar – quem vigia os vigias? – foi abordado por Platão há mais de dois milênios.

A seleção de técnicos de reputação ilibada e reconhecimento no setor busca justamente contar com a sua alta capacidade de tomar as melhores decisões para o bem-estar da população. Esses técnicos podem receber metas de desempenho e um mandato que especifique com clareza o que devem perseguir. Com regras do jogo mais claras e estáveis, espera-se mais investimento e mais competição, tendendo a preços e tarifas menores no futuro.

Numa boa democracia, ninguém pode mandar. Deve, sim, existir um inteligente sistema de pesos e contrapesos, onde os excessos de um poder sejam limitados por outro, com muito critério e transparência.

(No dia 15/2, às 9 horas, será feito um debate no Insper justamente para discutir essas questões. Mais informações sobre o evento podem ser vistas clicando aqui)

* Sérgio Lazzarini e professor titular do Insper, autor de “Capitalismo de Laços” e “Reinventando o Capitalismo de Estado”. Contato: sergiogl1@insper.edu.br

Por que agências devem ter autonomia?

Por Sérgio Lazzarini* Vários setores da economia, no Brasil e no exterior, são regulados por agências responsáveis por monitorar o desempenho das firmas e o comportamento dos preços. A Anatel e a Aneel, por exemplo, regulam os setores de telecomunicações e energia no Brasil. Mas de onde vêm esses reguladores? Por que não é o próprio governante, eleito pela população, o dono da voz sobre o que deve ser feito e o que é mais adequado em cada setor? Vejamos um caso. Logo após ter assumido a Presidência, em fevereiro de 2003, Lula recebeu a notícia (segundo ele, pelos jornais) que determinadas agências haviam autorizado aumentos de tarifas. Encarecer serviços pagos diretamente pela população não é algo que particularmente pega bem para um governante. Contrariado, disse que as agências estavam “mandando no país”. A sua ministra de Minas e Energia à época, ninguém menos que Dilma Rousseff, passou a pedir para sua agência, a Aneel, “tarifas módicas”. De lá para cá, muitas das agências reguladoras no Brasil foram enfraquecidas, sendo progressivamente transformadas em oportunidade de emprego para aliados políticos e recorrentemente postas de lado pelo governo em decisões importantes. Em 2012, já eleita presidente, Dilma seguiu com sua ideia de tarifas módicas e forçou uma redução do preço da energia elétrica em troca de renovação antecipada de algumas concessões no setor. Alguns técnicos da própria Aneel se manifestaram contrários a essa intervenção, mas não foram ouvidos na decisão final. Parece, a princípio, natural que o governante deva buscar menores preços e tarifas para a população. Mas isso tem um efeito colateral perverso. As empresas investem quando vislumbram um cenário mais estável e que as permita lucrar. Quando o governo em exercício faz intervenções ao seu bel prazer, não somente tende a reduzir a rentabilidade dos projetos privados como também aumenta o risco percebido pelos empresários. No limite, eles param de investir. É exatamente o que estamos presenciando no Brasil agora. Como mudar isso? O remédio, absolutamente urgente, é reconstruir as agências reguladoras no Brasil, dotando-as de especialistas com mandato claro e critérios técnicos em vez de políticos. Esses especialistas devem ter força suficiente para servir de contraponto a governantes que repentinamente queiram mandar no setor. Por lei, são os senadores os responsáveis por autorizar o apontamento dos gestores das agências. Um projeto em discussão, de autoria do senador Ricardo Ferraço, vai um pouco além: propõe não apenas requisitos técnicos para o apontamento dos dirigentes das agências, como também um mecanismo de pré-arguição dos candidatos, em sessão aberta ao público. Muitos, corretamente, perguntarão: – Mas quem regula o regulador? O que garante que esses técnicos irão fazer as melhores escolhas? Não se trata de questão trivial. Dilema similar – quem vigia os vigias? – foi abordado por Platão há mais de dois milênios. A seleção de técnicos de reputação ilibada e reconhecimento no setor busca justamente contar com a sua alta capacidade de tomar as melhores decisões para o bem-estar da população. Esses técnicos podem receber metas de desempenho e um mandato que especifique com clareza o que devem perseguir. Com regras do jogo mais claras e estáveis, espera-se mais investimento e mais competição, tendendo a preços e tarifas menores no futuro. Numa boa democracia, ninguém pode mandar. Deve, sim, existir um inteligente sistema de pesos e contrapesos, onde os excessos de um poder sejam limitados por outro, com muito critério e transparência. (No dia 15/2, às 9 horas, será feito um debate no Insper justamente para discutir essas questões. Mais informações sobre o evento podem ser vistas clicando aqui) * Sérgio Lazzarini e professor titular do Insper, autor de “Capitalismo de Laços” e “Reinventando o Capitalismo de Estado”. Contato: sergiogl1@insper.edu.br
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