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(Foto: Nações Unidas)

Há uma crise humanitária se desdobrando na Venezuela. Não é a única do mundo. Mas, diferentemente do que ocorre na Síria, na Somália ou no Burundi, a crise venezuelana nos afeta diretamente. Milhares de famintos têm procurado refúgio e sobrevivência no Brasil e entrado no país pela fronteira com Roraima, muitas vezes pegando carona ou andando a pé por muitos quilômetros.

A crise venezuelana também é uma oportunidade para aprendermos mais sobre como funciona o mundo e como nós funcionamos.

Não é por acaso que essa crise tenha ocorrido na Venezuela. A Venezuela é governada há quase duas décadas por um governo populista de esquerda, capitaneado primeiro por Hugo Chávez e depois por seu sucessor Nicolás Maduro, que seguiu os passos de outros déspotas para se perpetuar no poder.

É uma velha tática: para subjugar o povo, é necessário destruir a capacidade do setor privado de sobreviver independentemente do Estado. É imperativo, sobretudo, que a produção de alimentos independente do Estado seja destruída, pois é com o controle da distribuição de alimentos e a ameaça de fome para os opositores que regimes despóticos se mantêm no poder.

Foi assim em Cuba e na União Soviética, onde a coletivização da agricultura na Ucrânia causou a morte de milhões de pequenos e médios agricultores (a chamada pequena burguesia rural).

Na Venezuela, produtores de alimentos foram empurrados para a falência e suas empresas socializadas, isto é, postas sob controle de seguidores fiéis do regime. O governo criou uma rede estatal de supermercados populares com o objetivo de distribuir comida para a população desempregada, em troca de submissão ao chavismo.

A rica indústria de exploração de petróleo foi sucateada e produz menos petróleo do que produzia vinte anos atrás. A estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA) perdeu seu corpo técnico competente, substituído por chavistas, e virou uma mina de ouro para o regime.

Boa parte dos venezuelanos mais instruídos fugiu para países como Estados Unidos ou México. Com sua classe média reduzida e derrotada, o governo de Nicolás Maduro se beneficia da fome de sua população como instrumento de controle das massas.

Temos nossa parcela de responsabilidade nesse processo. Afinal, por mais de uma década nosso governo eleito aplaudiu a decadência do vizinho, subsidiou obras públicas e concedeu empréstimos que na realidade são doações, porque nunca serão pagos por um regime que já então mostrava sinais óbvios de vocação despótica.

Estamos pagando o custo. Ou pelo menos os roraimenses, que têm arcado com um aumento repentino de população na capital, com a consequente pressão sobre a capacidade de suas escolas e hospitais públicos. São eles, ainda, que arcam com o mal-estar provocado por milhares de venezuelanos dormindo ao relento em praças públicas.

O governo federal não pode fechar os olhos e deixar que o fardo recaia apenas sobre o Estado e as prefeituras de Roraima. Apesar da atual restrição de recursos, é nosso papel abrir as portas para nossos vizinhos famintos. O dever moral de ajudar o próximo é parte de nossa humanidade comum e independe de crenças religiosas.

Além disso, essa acolhida traz vantagens práticas, do nosso próprio interesse. Refugiados podem se tornar cidadãos produtivos; entre os venezuelanos, há pessoas de diversos níveis de educação e de experiência profissional que podem contribuir para o desenvolvimento do nosso país.

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Originalmente publicado na Coluna do Por Quê?, na Folha
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Por que receber refugiados da Venezuela?

(Foto: Nações Unidas) Há uma crise humanitária se desdobrando na Venezuela. Não é a única do mundo. Mas, diferentemente do que ocorre na Síria, na Somália ou no Burundi, a crise venezuelana nos afeta diretamente. Milhares de famintos têm procurado refúgio e sobrevivência no Brasil e entrado no país pela fronteira com Roraima, muitas vezes pegando carona ou andando a pé por muitos quilômetros. A crise venezuelana também é uma oportunidade para aprendermos mais sobre como funciona o mundo e como nós funcionamos. Não é por acaso que essa crise tenha ocorrido na Venezuela. A Venezuela é governada há quase duas décadas por um governo populista de esquerda, capitaneado primeiro por Hugo Chávez e depois por seu sucessor Nicolás Maduro, que seguiu os passos de outros déspotas para se perpetuar no poder. É uma velha tática: para subjugar o povo, é necessário destruir a capacidade do setor privado de sobreviver independentemente do Estado. É imperativo, sobretudo, que a produção de alimentos independente do Estado seja destruída, pois é com o controle da distribuição de alimentos e a ameaça de fome para os opositores que regimes despóticos se mantêm no poder. Foi assim em Cuba e na União Soviética, onde a coletivização da agricultura na Ucrânia causou a morte de milhões de pequenos e médios agricultores (a chamada pequena burguesia rural). Na Venezuela, produtores de alimentos foram empurrados para a falência e suas empresas socializadas, isto é, postas sob controle de seguidores fiéis do regime. O governo criou uma rede estatal de supermercados populares com o objetivo de distribuir comida para a população desempregada, em troca de submissão ao chavismo. A rica indústria de exploração de petróleo foi sucateada e produz menos petróleo do que produzia vinte anos atrás. A estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA) perdeu seu corpo técnico competente, substituído por chavistas, e virou uma mina de ouro para o regime. Boa parte dos venezuelanos mais instruídos fugiu para países como Estados Unidos ou México. Com sua classe média reduzida e derrotada, o governo de Nicolás Maduro se beneficia da fome de sua população como instrumento de controle das massas. Temos nossa parcela de responsabilidade nesse processo. Afinal, por mais de uma década nosso governo eleito aplaudiu a decadência do vizinho, subsidiou obras públicas e concedeu empréstimos que na realidade são doações, porque nunca serão pagos por um regime que já então mostrava sinais óbvios de vocação despótica. Estamos pagando o custo. Ou pelo menos os roraimenses, que têm arcado com um aumento repentino de população na capital, com a consequente pressão sobre a capacidade de suas escolas e hospitais públicos. São eles, ainda, que arcam com o mal-estar provocado por milhares de venezuelanos dormindo ao relento em praças públicas. O governo federal não pode fechar os olhos e deixar que o fardo recaia apenas sobre o Estado e as prefeituras de Roraima. Apesar da atual restrição de recursos, é nosso papel abrir as portas para nossos vizinhos famintos. O dever moral de ajudar o próximo é parte de nossa humanidade comum e independe de crenças religiosas. Além disso, essa acolhida traz vantagens práticas, do nosso próprio interesse. Refugiados podem se tornar cidadãos produtivos; entre os venezuelanos, há pessoas de diversos níveis de educação e de experiência profissional que podem contribuir para o desenvolvimento do nosso país. * Originalmente publicado na Coluna do Por Quê?, na Folha * Para ficar por dentro do que rola no Por Quê?, clique aqui e assine a nossa Newsletter.
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