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O estado brasileiro é grande e ineficiente. Tem tamanho (como proporção do PIB) semelhante ao de países europeus, demandando como consequência uma quantidade grande de impostos para poder sustentá-lo. Mas a contrapartida em termos de qualidade de serviços públicos deixa muito a desejar.

É difícil vislumbrar uma melhora nesse quadro aumentando os impostos. Por isso, precisamos aumentar a eficiência do estado –fazendo com que se produza mais e melhores serviços públicos, porém, com a mesma quantidade de recursos.

A estrutura das carreiras do funcionalismo público certamente contribui para esse quadro de ineficiência. Grande parte dos servidores possui estabilidade, e as promoções na carreira dependem muito mais do tempo de serviço que do desempenho. Assim, a não ser pela motivação pessoal intrínseca, o incentivo a buscar um desempenho melhor é baixo, pois isso afeta muito pouco a remuneração do servidor.

Muitas vezes trata-se de pessoas altamente qualificadas, que passaram por concursos bastante concorridos, mas que têm pouca motivação para exercer seu potencial ao máximo. Um verdadeiro desperdício de talento.


De fato, estamos em um extremo –é quase impossível demitir um funcionário público concursado. Isso não significa, entretanto, que acabar com a estabilidade é uma boa alternativa. Na verdade, a estabilidade tem um papel importante, na medida em que blinda a burocracia estatal da interferência política.

Imagine se, a cada nova gestão, o político vencedor tivesse certa liberdade para demitir os funcionários públicos, e contratar novos. Além de retirar pessoas experientes e acostumadas a realizar tarefas específicas, ele acaba indicando aliados políticos, e não necessariamente gente competente.

Um artigo acadêmico recente, de autoria de Emanuele Colonnelli, Edoardo Teso e Mounu Prem, encontra evidências nessa linha para o caso brasileiro, usando dados de disputas eleitorais no nível municipal.

Os autores focam em eleições decididas por margens muito pequenas, nas quais o vencedor é determinado em grande medida pela sorte –ou seja, por elementos aleatórios, que não guardam relação com as características dos candidatos.

Prefeitos eleitos têm certa margem para contratar e demitir funcionários –por meio de cargos de confiança ou comissionados, por exemplo. Os autores observam mudanças significativas logo após a eleição, com o crescimento tanto de contratações como de demissões. Ou seja, prefeitos usam esse poder para fazer mudanças na administração pública.

Essas mudanças, entretanto, beneficiam decisivamente seus aliados políticos. Os autores identificam que pessoas com conexões com o político vencedor (porque foram candidatos a vereador na coalizão do novo prefeito ou porque doaram dinheiro para a campanha) têm uma chance significativamente mais elevada de estarem empregados no setor público nos anos consecutivos à eleição, em comparação aos apoiadores do político perdedor.

Essa chance é maior quanto mais a pessoa contribuiu para a chapa vencedora –trazendo mais votos para a coalizão, ou doando mais dinheiro.

E isso tem potenciais repercussões na qualidade do serviço público. Os autores mostram que os funcionários que apoiaram o prefeito eleito são em média menos qualificados, em termos da educação necessária para cumprir a função, na comparação com servidores que apoiaram outro candidato.

Trata-se de evidência de que a escolha com base na conexão política acaba levando a uma piora na qualificação dos funcionários.

Este efeito diz respeito a apenas uma fração dos empregos públicos –aqueles que o prefeito tem liberdade para indicar. Poderia ser ainda pior se os políticos vencedores pudessem demitir funcionários concursados e organizar novos concursos que favoreçam seus aliados.

A estabilidade do servidor limita esse poder, e acaba protegendo a qualidade da burocracia estatal.

Logicamente, na situação atual, em que a estabilidade é muito elevada, servidores não são motivados a exercer seu potencial, o que prejudica a qualidade do serviço público. Mas no outro extremo, em que não há nenhuma estabilidade, a influência política pode levar a uma rotatividade indesejada no setor público, além de facilitar a entrada de pessoas pouco qualificadas.

Precisamos buscar uma solução intermediária. Esse é um tema importante de política pública, que deveríamos estar discutindo na campanha eleitoral. Infelizmente, ele tem recebido pouca atenção de nossos políticos.

Originalmente publicado na Coluna do Por Quê? na Folha

 

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Qual o papel da estabilidade dos servidores?

O estado brasileiro é grande e ineficiente. Tem tamanho (como proporção do PIB) semelhante ao de países europeus, demandando como consequência uma quantidade grande de impostos para poder sustentá-lo. Mas a contrapartida em termos de qualidade de serviços públicos deixa muito a desejar. É difícil vislumbrar uma melhora nesse quadro aumentando os impostos. Por isso, precisamos aumentar a eficiência do estado –fazendo com que se produza mais e melhores serviços públicos, porém, com a mesma quantidade de recursos. A estrutura das carreiras do funcionalismo público certamente contribui para esse quadro de ineficiência. Grande parte dos servidores possui estabilidade, e as promoções na carreira dependem muito mais do tempo de serviço que do desempenho. Assim, a não ser pela motivação pessoal intrínseca, o incentivo a buscar um desempenho melhor é baixo, pois isso afeta muito pouco a remuneração do servidor. Muitas vezes trata-se de pessoas altamente qualificadas, que passaram por concursos bastante concorridos, mas que têm pouca motivação para exercer seu potencial ao máximo. Um verdadeiro desperdício de talento. ? De fato, estamos em um extremo –é quase impossível demitir um funcionário público concursado. Isso não significa, entretanto, que acabar com a estabilidade é uma boa alternativa. Na verdade, a estabilidade tem um papel importante, na medida em que blinda a burocracia estatal da interferência política. Imagine se, a cada nova gestão, o político vencedor tivesse certa liberdade para demitir os funcionários públicos, e contratar novos. Além de retirar pessoas experientes e acostumadas a realizar tarefas específicas, ele acaba indicando aliados políticos, e não necessariamente gente competente. Um artigo acadêmico recente, de autoria de Emanuele Colonnelli, Edoardo Teso e Mounu Prem, encontra evidências nessa linha para o caso brasileiro, usando dados de disputas eleitorais no nível municipal. Os autores focam em eleições decididas por margens muito pequenas, nas quais o vencedor é determinado em grande medida pela sorte –ou seja, por elementos aleatórios, que não guardam relação com as características dos candidatos. Prefeitos eleitos têm certa margem para contratar e demitir funcionários –por meio de cargos de confiança ou comissionados, por exemplo. Os autores observam mudanças significativas logo após a eleição, com o crescimento tanto de contratações como de demissões. Ou seja, prefeitos usam esse poder para fazer mudanças na administração pública. Essas mudanças, entretanto, beneficiam decisivamente seus aliados políticos. Os autores identificam que pessoas com conexões com o político vencedor (porque foram candidatos a vereador na coalizão do novo prefeito ou porque doaram dinheiro para a campanha) têm uma chance significativamente mais elevada de estarem empregados no setor público nos anos consecutivos à eleição, em comparação aos apoiadores do político perdedor. Essa chance é maior quanto mais a pessoa contribuiu para a chapa vencedora –trazendo mais votos para a coalizão, ou doando mais dinheiro. E isso tem potenciais repercussões na qualidade do serviço público. Os autores mostram que os funcionários que apoiaram o prefeito eleito são em média menos qualificados, em termos da educação necessária para cumprir a função, na comparação com servidores que apoiaram outro candidato. Trata-se de evidência de que a escolha com base na conexão política acaba levando a uma piora na qualificação dos funcionários. Este efeito diz respeito a apenas uma fração dos empregos públicos –aqueles que o prefeito tem liberdade para indicar. Poderia ser ainda pior se os políticos vencedores pudessem demitir funcionários concursados e organizar novos concursos que favoreçam seus aliados. A estabilidade do servidor limita esse poder, e acaba protegendo a qualidade da burocracia estatal. Logicamente, na situação atual, em que a estabilidade é muito elevada, servidores não são motivados a exercer seu potencial, o que prejudica a qualidade do serviço público. Mas no outro extremo, em que não há nenhuma estabilidade, a influência política pode levar a uma rotatividade indesejada no setor público, além de facilitar a entrada de pessoas pouco qualificadas. Precisamos buscar uma solução intermediária. Esse é um tema importante de política pública, que deveríamos estar discutindo na campanha eleitoral. Infelizmente, ele tem recebido pouca atenção de nossos políticos. Originalmente publicado na Coluna do Por Quê? na Folha   Para ficar por dentro do que rola no Por Quê?, clique aqui e assine a nossa Newsletter.
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