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BNDES-Agência-Brasil

O Brasil possui uma série de programas governamentais que têm como objetivo estimular o setor privado. Recentemente chamaram a atenção notícias de que Luciano Huck e João Doria adquiriram jatinhos usando recursos do Finame, linha de crédito do BNDES destinada à compra de máquinas e equipamentos. Mas esse é apenas um exemplo dos diversos programas de apoio ao setor produtivo, que cresceram aceleradamente nos últimos 10 anos, com destaque para a atuação do BNDES provendo crédito subsidiado.

Defensores desse tipo de intervenção ressaltam benefícios como a geração de empregos e o estímulo a ganhos de produtividade e inovação. Mas isso é suficiente para justificar tais políticas?

Primeiro, é preciso perguntar: o empresário realizaria um investimento, por exemplo, mesmo sem a ajuda do governo? Pense em uma empresa interessada em comprar uma máquina nova, que lhe dará um retorno esperado de 15%. Ela consegue tomar emprestado a 8% no mercado privado. Ou seja, mesmo sem subsídios governamentais o investimento é viável.

Se um banco público lhe oferece crédito a uma taxa mais baixa – 3%, por exemplo –, ela obviamente preferirá essa opção. Mas a existência do crédito subsidiado não muda nada: o investimento continua sendo feito. A única diferença é que o empresário ficou mais rico – transferiram-se recursos do contribuinte para o bolso dele.

Nesse caso, obviamente não vale a pena gastar dinheiro público para apoiar as ações da empresa.

Haveria, sim, um argumento em favor da intervenção do governo se o retorno privado fosse baixo, mas o retorno social alto. Nessa situação, para o empresário não compensaria o custo de realizar o investimento, mas para a sociedade valeria a pena. Assim, um empurrãozinho do governo poderia incentivá-lo a realizar a inovação ou o investimento.

Isso ocorreria se o empresário, ao promover uma inovação, impactasse positivamente não apenas a produtividade de sua empresa, mas também a de outras firmas e setores. O retorno privado incorpora apenas o impacto sobre a produtividade da empresa que faz a inovação; o retorno social capta também o efeito sobre outras partes da economia.

Outra possibilidade é que o projeto de investimento é rentável tanto privada como socialmente, mas a empresa se defronta com restrições de crédito, ou seja, não consegue financiamento no mercado financeiro. Uma ajuda do governo pode, em tese, destravar esse mecanismo, possibilitando investimento, inovação e ganhos de produtividade.

Aqui haveria motivação para o apoio do governo. Mas ainda assim não é suficiente para justificá-la. Por quê?

Porque o dinheiro público é escasso, logo, teria usos alternativos. Quando o utilizamos para apoiar o setor de informática ou a indústria automobilística, por exemplo, deixamos de aplicá-lo em outras áreas (como saúde, educação, saneamento, infraestrutura, cultura etc.). Poderíamos também não gastar esses recursos, usando-os para abater a dívida pública ou reduzir os impostos pagos pela população.

Devemos então nos perguntar: o ganho social é suficiente para compensar o apoio a determinado setor em vez da utilização do dinheiro público para financiar outras coisas?

No final de 2017, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) divulgou um estudo contendo avaliações de um conjunto de programas de apoio ao setor produtivo no Brasil. Para tanto, compararam o comportamento de empresas contempladas por determinado programa com o de empresas semelhantes que não receberam o apoio. De modo geral, as conclusões apontam efeitos muito pequenos (praticamente nulos) sobre produtividade, emprego e salários – clique aqui para acessar a pesquisa completa.

Como dito, supostos aumentos no emprego e na produtividade não são suficientes para justificar políticas de estímulo ao setor produtivo privado. Mas para os principais programas brasileiros, que tanto cresceram na última década, não há nem evidência de que isso ocorreu.

Os resultados da pesquisa do BID sugerem, assim, que tais programas têm retorno social negativo: os benefícios para a sociedade (em termos de ganhos de inovação e produtividade) são pequenos ou quase nulos, mas há custos – afinal, os recursos poderiam ter financiado outras coisas.

Isso não implica, entretanto, que políticas de apoio ao setor produtivo sempre apresentarão retorno negativo. No caso brasileiro, a evidência de fracasso pode simplesmente decorrer do desenho do programa. O relatório do BID ressalta que os programas avaliados, em geral, não têm metas bem definidas ou políticas de monitoramento. O empresário que capta o recurso não tem compromisso de aumentar sua produtividade, o que poderia explicar a ausência de efeitos positivos dos programas avaliados.

Outra possibilidade levantada no documento: muitos programas estavam atrelados a compras de insumos (como máquinas e equipamentos) produzidos com forte conteúdo local. E, dessa forma, podem ter induzido a troca de equipamento estrangeiro por nacional, que tende a ser menos produtivo. Isso teria prejudicado os ganhos de produtividade das indústrias atendidas.

Essa discussão ressalta a importância de que programas governamentais sejam monitorados e avaliados com frequência, permitindo-se que sejam aperfeiçoados (e, no limite, interrompidos), caso se detecte que seus benefícios são pequenos se comparados aos custos. Evita-se, assim, que recursos públicos escassos sejam desperdiçados em iniciativas de baixo retorno social.

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Publicado originalmente na Coluna do Por Quê? na Folha

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O setor produtivo precisa de dinheiro público?

BNDES-Agência-Brasil O Brasil possui uma série de programas governamentais que têm como objetivo estimular o setor privado. Recentemente chamaram a atenção notícias de que Luciano Huck e João Doria adquiriram jatinhos usando recursos do Finame, linha de crédito do BNDES destinada à compra de máquinas e equipamentos. Mas esse é apenas um exemplo dos diversos programas de apoio ao setor produtivo, que cresceram aceleradamente nos últimos 10 anos, com destaque para a atuação do BNDES provendo crédito subsidiado. Defensores desse tipo de intervenção ressaltam benefícios como a geração de empregos e o estímulo a ganhos de produtividade e inovação. Mas isso é suficiente para justificar tais políticas? Primeiro, é preciso perguntar: o empresário realizaria um investimento, por exemplo, mesmo sem a ajuda do governo? Pense em uma empresa interessada em comprar uma máquina nova, que lhe dará um retorno esperado de 15%. Ela consegue tomar emprestado a 8% no mercado privado. Ou seja, mesmo sem subsídios governamentais o investimento é viável. Se um banco público lhe oferece crédito a uma taxa mais baixa – 3%, por exemplo –, ela obviamente preferirá essa opção. Mas a existência do crédito subsidiado não muda nada: o investimento continua sendo feito. A única diferença é que o empresário ficou mais rico – transferiram-se recursos do contribuinte para o bolso dele. Nesse caso, obviamente não vale a pena gastar dinheiro público para apoiar as ações da empresa. Haveria, sim, um argumento em favor da intervenção do governo se o retorno privado fosse baixo, mas o retorno social alto. Nessa situação, para o empresário não compensaria o custo de realizar o investimento, mas para a sociedade valeria a pena. Assim, um empurrãozinho do governo poderia incentivá-lo a realizar a inovação ou o investimento. Isso ocorreria se o empresário, ao promover uma inovação, impactasse positivamente não apenas a produtividade de sua empresa, mas também a de outras firmas e setores. O retorno privado incorpora apenas o impacto sobre a produtividade da empresa que faz a inovação; o retorno social capta também o efeito sobre outras partes da economia. Outra possibilidade é que o projeto de investimento é rentável tanto privada como socialmente, mas a empresa se defronta com restrições de crédito, ou seja, não consegue financiamento no mercado financeiro. Uma ajuda do governo pode, em tese, destravar esse mecanismo, possibilitando investimento, inovação e ganhos de produtividade. Aqui haveria motivação para o apoio do governo. Mas ainda assim não é suficiente para justificá-la. Por quê? Porque o dinheiro público é escasso, logo, teria usos alternativos. Quando o utilizamos para apoiar o setor de informática ou a indústria automobilística, por exemplo, deixamos de aplicá-lo em outras áreas (como saúde, educação, saneamento, infraestrutura, cultura etc.). Poderíamos também não gastar esses recursos, usando-os para abater a dívida pública ou reduzir os impostos pagos pela população. Devemos então nos perguntar: o ganho social é suficiente para compensar o apoio a determinado setor em vez da utilização do dinheiro público para financiar outras coisas? No final de 2017, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) divulgou um estudo contendo avaliações de um conjunto de programas de apoio ao setor produtivo no Brasil. Para tanto, compararam o comportamento de empresas contempladas por determinado programa com o de empresas semelhantes que não receberam o apoio. De modo geral, as conclusões apontam efeitos muito pequenos (praticamente nulos) sobre produtividade, emprego e salários – clique aqui para acessar a pesquisa completa. Como dito, supostos aumentos no emprego e na produtividade não são suficientes para justificar políticas de estímulo ao setor produtivo privado. Mas para os principais programas brasileiros, que tanto cresceram na última década, não há nem evidência de que isso ocorreu. Os resultados da pesquisa do BID sugerem, assim, que tais programas têm retorno social negativo: os benefícios para a sociedade (em termos de ganhos de inovação e produtividade) são pequenos ou quase nulos, mas há custos – afinal, os recursos poderiam ter financiado outras coisas. Isso não implica, entretanto, que políticas de apoio ao setor produtivo sempre apresentarão retorno negativo. No caso brasileiro, a evidência de fracasso pode simplesmente decorrer do desenho do programa. O relatório do BID ressalta que os programas avaliados, em geral, não têm metas bem definidas ou políticas de monitoramento. O empresário que capta o recurso não tem compromisso de aumentar sua produtividade, o que poderia explicar a ausência de efeitos positivos dos programas avaliados. Outra possibilidade levantada no documento: muitos programas estavam atrelados a compras de insumos (como máquinas e equipamentos) produzidos com forte conteúdo local. E, dessa forma, podem ter induzido a troca de equipamento estrangeiro por nacional, que tende a ser menos produtivo. Isso teria prejudicado os ganhos de produtividade das indústrias atendidas. Essa discussão ressalta a importância de que programas governamentais sejam monitorados e avaliados com frequência, permitindo-se que sejam aperfeiçoados (e, no limite, interrompidos), caso se detecte que seus benefícios são pequenos se comparados aos custos. Evita-se, assim, que recursos públicos escassos sejam desperdiçados em iniciativas de baixo retorno social. * Publicado originalmente na Coluna do Por Quê? na Folha * Para ficar por dentro do que rola no Por Quê?, clique aqui e assine a nossa Newsletter.
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