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A greve dos caminhoneiros trouxe à tona a discussão sobre o preço dos combustíveis. Afinal, em uma comparação internacional, a gasolina no Brasil é demasiadamente cara? Os dados sugerem que não.



A página Global Petrol Prices traz informações sobre preços de combustíveis (no varejo) no mundo. O gráfico a seguir mostra o preço da gasolina (em dólares por litro) no início de julho em 165 países. Os dados foram extraídos do site no dia 6 de julho.

Gas_grafico1

Note que o preço varia bastante entre países, indo de irrisórios US$ 0,01 na Venezuela, até US$ 2,12 na Islândia. O Brasil (destacado em preto no gráfico) está próximo ao centro da distribuição, com o preço cotado a US$ 1,15, que corresponde a R$ 4,44 ao câmbio do dia 6/7. Temos o 88.º preço mais baixo (ou 77.º mais alto) dentre os 165 países. Estamos bem longe, assim, de pagar uma das gasolinas mais caras do mundo.

O preço brasileiro está um pouquinho abaixo da média simples dos 165 países, que é igual a US$ 1,17. Se calcularmos a média ponderada – dando mais peso para países maiores em termos de população – nosso preço fica acima dela, mas não por uma margem muito grande.

Uma possível crítica à comparação acima é que ela não leva em conta diferenças de renda per capita entre países. De fato, há vários países da Europa Ocidental – como França, Itália, Dinamarca, Portugal, Noruega e Islândia – em que a gasolina é bastante cara. E esses países são também ricos.

Afinal, deveríamos esperar alguma relação entre renda per capita e preços? Por um lado, o combustível é um produto relativamente homogêneo e fácil de transportar. Não é de se esperar que apresente diferenças muito grandes entre países. Em particular, não é de se esperar que ele seja sistematicamente mais elevado nos países ricos. Um produtor na Arábia Saudita não venderá o combustível a um preço menor para etíopes do que para canadenses, apenas porque a Etiópia é mais pobre.

Mas isso vale só até o combustível chegar ao porto. Para que atinja a bomba, há impostos, e uma série de outros componentes (como distribuição e entrega ao consumidor final) que dependem fortemente de insumos locais, como infraestrutura e mão de obra.

Como os salários tendem a ser mais elevados nos países mais ricos, esses custos de distribuição e vendas podem ser maiores neles – o que acabaria se refletindo no preço do combustível. Por esse mecanismo, teríamos uma correlação positiva entre o preço da gasolina e renda per capita. Além disso, em diversos países ricos (como da Europa Ocidental), o imposto sobre combustível é consideravelmente alto, o que deve contribuir para essa correlação positiva.

O que dizem os dados? Abaixo temos um diagrama de dispersão, que nos permite visualizar como as duas variáveis estão correlacionadas. Ele traz informações sobre preço do combustível (no eixo vertical) e renda per capita (no eixo horizontal) para 152 países. Cada ponto corresponde a um país. Os dados de preço são os mesmos do gráfico anterior, enquanto a renda per capita refere-se ao ano de 2015.

Gas_grafico2

A linha preta é a reta que melhor se ajusta à nuvem de pontos. Note que ela é ascendente, o que significa que, de fato, há uma correlação positiva (porém não muito forte) entre as duas variáveis nos dados. Em média, países mais ricos tendem a ter gasolina mais cara.

(Especificamente,  relacionamos o logaritmo do preço da gasolina com o  logaritmo da renda per capita, que é maneira usual de analisar diferenças de preços entre países na literatura em economia. Outras especificações, entretanto, produzem resultados semelhantes.)

O diagrama de dispersão permite também que o preço médio da gasolina varie em função da renda per capita. E como a reta é ascendente, o preço médio será maior quanto mais alta for a renda per capita. Com base nisso podemos ainda comparar o preço brasileiro com a média mundial, expurgando o efeito da renda per capita.

O Brasil é o ponto vermelho no gráfico. Note que ele está um pouco acima da reta. Isso significa que nosso preço é superior à média, mas não por uma margem elevada. Na verdade, estatisticamente não é possível concluir a gasolina brasileira é diferente da média. Em outras palavras, mesmo depois de levarmos em conta diferenças de renda per capita, o preço da gasolina no Brasil não é muito superior à média mundial.

Para finalizar, um último exercício estatístico: retiramos de nossa amostra os grandes exportadores de combustível –ou seja, países em que os combustíveis são responsáveis por pelo menos 50% de suas exportações totais em 2015. Nesses países, o preço da gasolina tende a ser bem mais baixo. Os resultados estão no gráfico a seguir, que inclui 137 países.

Gas_grafico3

O ajuste da reta à dispersão de dados melhora bastante com a nova amostra. E agora o preço brasileiro é um pouco inferior à média (o ponto vermelho está ligeiramente abaixo da reta preta). De qualquer forma, novamente não dá para distinguir esse valor da média em termos estatísticos.

A gasolina brasileira é cara na comparação com outros países? Os dados indicam que não. Na verdade, nosso preço é próximo à média, mesmo depois de considerarmos o impacto de diferenças de renda per capita entre países.

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Fontes dos dados:

Preço da gasolina (julho de 2018): www.globalpetrolprices.com/gasoline_prices

Renda per capita (2015): World Development Indicators, Banco Mundial (dados em dólares ajustados pela Paridade do Poder de Compra).

População (2015): World Development Indicators, Banco Mundial.

Exportações de Combustíveis, como proporção das exportações totais (2015): World Development Indicators, Banco Mundial.

 

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A gasolina é cara no Brasil?

A greve dos caminhoneiros trouxe à tona a discussão sobre o preço dos combustíveis. Afinal, em uma comparação internacional, a gasolina no Brasil é demasiadamente cara? Os dados sugerem que não. A página Global Petrol Prices traz informações sobre preços de combustíveis (no varejo) no mundo. O gráfico a seguir mostra o preço da gasolina (em dólares por litro) no início de julho em 165 países. Os dados foram extraídos do site no dia 6 de julho. Gas_grafico1 Note que o preço varia bastante entre países, indo de irrisórios US$ 0,01 na Venezuela, até US$ 2,12 na Islândia. O Brasil (destacado em preto no gráfico) está próximo ao centro da distribuição, com o preço cotado a US$ 1,15, que corresponde a R$ 4,44 ao câmbio do dia 6/7. Temos o 88.º preço mais baixo (ou 77.º mais alto) dentre os 165 países. Estamos bem longe, assim, de pagar uma das gasolinas mais caras do mundo. O preço brasileiro está um pouquinho abaixo da média simples dos 165 países, que é igual a US$ 1,17. Se calcularmos a média ponderada – dando mais peso para países maiores em termos de população – nosso preço fica acima dela, mas não por uma margem muito grande. Uma possível crítica à comparação acima é que ela não leva em conta diferenças de renda per capita entre países. De fato, há vários países da Europa Ocidental – como França, Itália, Dinamarca, Portugal, Noruega e Islândia – em que a gasolina é bastante cara. E esses países são também ricos. Afinal, deveríamos esperar alguma relação entre renda per capita e preços? Por um lado, o combustível é um produto relativamente homogêneo e fácil de transportar. Não é de se esperar que apresente diferenças muito grandes entre países. Em particular, não é de se esperar que ele seja sistematicamente mais elevado nos países ricos. Um produtor na Arábia Saudita não venderá o combustível a um preço menor para etíopes do que para canadenses, apenas porque a Etiópia é mais pobre. Mas isso vale só até o combustível chegar ao porto. Para que atinja a bomba, há impostos, e uma série de outros componentes (como distribuição e entrega ao consumidor final) que dependem fortemente de insumos locais, como infraestrutura e mão de obra. Como os salários tendem a ser mais elevados nos países mais ricos, esses custos de distribuição e vendas podem ser maiores neles – o que acabaria se refletindo no preço do combustível. Por esse mecanismo, teríamos uma correlação positiva entre o preço da gasolina e renda per capita. Além disso, em diversos países ricos (como da Europa Ocidental), o imposto sobre combustível é consideravelmente alto, o que deve contribuir para essa correlação positiva. O que dizem os dados? Abaixo temos um diagrama de dispersão, que nos permite visualizar como as duas variáveis estão correlacionadas. Ele traz informações sobre preço do combustível (no eixo vertical) e renda per capita (no eixo horizontal) para 152 países. Cada ponto corresponde a um país. Os dados de preço são os mesmos do gráfico anterior, enquanto a renda per capita refere-se ao ano de 2015. Gas_grafico2 A linha preta é a reta que melhor se ajusta à nuvem de pontos. Note que ela é ascendente, o que significa que, de fato, há uma correlação positiva (porém não muito forte) entre as duas variáveis nos dados. Em média, países mais ricos tendem a ter gasolina mais cara. (Especificamente,  relacionamos o logaritmo do preço da gasolina com o  logaritmo da renda per capita, que é maneira usual de analisar diferenças de preços entre países na literatura em economia. Outras especificações, entretanto, produzem resultados semelhantes.) O diagrama de dispersão permite também que o preço médio da gasolina varie em função da renda per capita. E como a reta é ascendente, o preço médio será maior quanto mais alta for a renda per capita. Com base nisso podemos ainda comparar o preço brasileiro com a média mundial, expurgando o efeito da renda per capita. O Brasil é o ponto vermelho no gráfico. Note que ele está um pouco acima da reta. Isso significa que nosso preço é superior à média, mas não por uma margem elevada. Na verdade, estatisticamente não é possível concluir a gasolina brasileira é diferente da média. Em outras palavras, mesmo depois de levarmos em conta diferenças de renda per capita, o preço da gasolina no Brasil não é muito superior à média mundial. Para finalizar, um último exercício estatístico: retiramos de nossa amostra os grandes exportadores de combustível –ou seja, países em que os combustíveis são responsáveis por pelo menos 50% de suas exportações totais em 2015. Nesses países, o preço da gasolina tende a ser bem mais baixo. Os resultados estão no gráfico a seguir, que inclui 137 países. Gas_grafico3 O ajuste da reta à dispersão de dados melhora bastante com a nova amostra. E agora o preço brasileiro é um pouco inferior à média (o ponto vermelho está ligeiramente abaixo da reta preta). De qualquer forma, novamente não dá para distinguir esse valor da média em termos estatísticos. A gasolina brasileira é cara na comparação com outros países? Os dados indicam que não. Na verdade, nosso preço é próximo à média, mesmo depois de considerarmos o impacto de diferenças de renda per capita entre países. + Fontes dos dados: Preço da gasolina (julho de 2018): www.globalpetrolprices.com/gasoline_prices Renda per capita (2015): World Development Indicators, Banco Mundial (dados em dólares ajustados pela Paridade do Poder de Compra). População (2015): World Development Indicators, Banco Mundial. Exportações de Combustíveis, como proporção das exportações totais (2015): World Development Indicators, Banco Mundial.   Para ficar por dentro do que rola no Por Quê?, clique aqui e assine a nossa Newsletter.
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