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Em um dos mais vis atos de campanha eleitoral da história do país, em 2014 os marqueteiros de Dilma Rousseff associaram a proposta da candidata Marina Silva de independência formal do Banco Central a ações excusas de banqueiros gananciosos roubando a comida de uma família. Uma estultice sem nenhuma lógica que a justificasse. Em países onde os bancos centrais usufruem de independência formal há mais pessoas passando fome, ou maior desigualdade? Não, obviamente. Alguém se deu ao trabalho de olhar os dados? Não, obviamente.

Na semana passada, o Senado Federal aprovou a proposta de independência formal do BC, que já vinha sendo debatida há tempos no Congresso. Mas o Banco Central não é já independente? Não decide o que acontece com a taxa de juros sem consultar o chefe do Executivo? Sim, mas a independência é de natureza informal, não legal. Mais importante, quando muda o presidente, muda o presidente do BC (não necessariamente no dia seguinte), o que gera um alinhamento de incentivos indesejável. Idealmente, o BC deveria atribuir importância zero para a proximidade ou a distância das eleições. O horizonte da política monetária nada tem a ver com o da política.

O passo dado nessa semana foi no sentido de fortalecer, tornar mais crível, a ideia de que a autoridade monetária não precisa se preocupar com o ciclo político, e sim com manter a inflação próxima à meta (que deverá ser determinada pelos representantes legais dos eleitores, não pelo burocrata no comando da instituição). Misturar política monetária com política eleitoral é explosivo. Mina a credibilidade. 

Pensemos em termos do seguinte modelinho (que dá inclusive para pôr num formato matemático): o BC promete uma inflação de x%; as eleições vão chegando e a economia está um pouco fraca, temporariamente. Se o efeito é passageiro, talvez caiba apenas um corte bem pequeno dos juros. Mas aí o Executivo poderá se mostrar insatisfeito e bicudo, pois uma queda maior dos juros, ainda que gere problemas para a inflação daqui a uns trimestres, o ajudaria nas vésperas do pleito – que é o que interessa sob seu ponto de vista. Com isso tudo em jogo, os agentes econômicos vão levar pouco a sério a promessa da autoridade monetária de agir de modo a estabilizar a inflação em torno da meta. Isso, por sua vez, pode gerar uma desancoragem de expectativas, o que, como o cachorro que corre atrás do próprio rabo, tornará mais difícil a tarefa do Banco Central de atingir a meta.

Agora, se o Banco Central for totalmente independente do Executivo, com mandatos descasados – por exemplo, o do Executivo termina em 2022, mas o mandato da diretoria do Banco Central apenas em 2024 –, essa dinâmica de expectativas perversa se dilui, e o objetivo inflacionário é atingido mais facilmente devido ao ganho de credibilidade. 

Esta coluna apoia o projeto de independência, mas faz uma espécie de advertência: essa reforma está longe de ser a prioridade do momento. Talvez seja fácil de aprovar, na medida em que custará pouco em termos de capital político despendido no processo. Ok. Mas independência do Banco Central não é mágica. Pouco adianta termos um Banco Central independente quando o equilíbrio fiscal vai se encaminhando perigosamente para o buraco.  É aí que mora o perigo. 

COLUNA PUBLICADA NA FOLHA DE SÃO PAULO

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A independência do Banco Central

Em um dos mais vis atos de campanha eleitoral da história do país, em 2014 os marqueteiros de Dilma Rousseff associaram a proposta da candidata Marina Silva de independência formal do Banco Central a ações excusas de banqueiros gananciosos roubando a comida de uma família. Uma estultice sem nenhuma lógica que a justificasse. Em países onde os bancos centrais usufruem de independência formal há mais pessoas passando fome, ou maior desigualdade? Não, obviamente. Alguém se deu ao trabalho de olhar os dados? Não, obviamente.

Na semana passada, o Senado Federal aprovou a proposta de independência formal do BC, que já vinha sendo debatida há tempos no Congresso. Mas o Banco Central não é já independente? Não decide o que acontece com a taxa de juros sem consultar o chefe do Executivo? Sim, mas a independência é de natureza informal, não legal. Mais importante, quando muda o presidente, muda o presidente do BC (não necessariamente no dia seguinte), o que gera um alinhamento de incentivos indesejável. Idealmente, o BC deveria atribuir importância zero para a proximidade ou a distância das eleições. O horizonte da política monetária nada tem a ver com o da política.

O passo dado nessa semana foi no sentido de fortalecer, tornar mais crível, a ideia de que a autoridade monetária não precisa se preocupar com o ciclo político, e sim com manter a inflação próxima à meta (que deverá ser determinada pelos representantes legais dos eleitores, não pelo burocrata no comando da instituição). Misturar política monetária com política eleitoral é explosivo. Mina a credibilidade. 

Pensemos em termos do seguinte modelinho (que dá inclusive para pôr num formato matemático): o BC promete uma inflação de x%; as eleições vão chegando e a economia está um pouco fraca, temporariamente. Se o efeito é passageiro, talvez caiba apenas um corte bem pequeno dos juros. Mas aí o Executivo poderá se mostrar insatisfeito e bicudo, pois uma queda maior dos juros, ainda que gere problemas para a inflação daqui a uns trimestres, o ajudaria nas vésperas do pleito – que é o que interessa sob seu ponto de vista. Com isso tudo em jogo, os agentes econômicos vão levar pouco a sério a promessa da autoridade monetária de agir de modo a estabilizar a inflação em torno da meta. Isso, por sua vez, pode gerar uma desancoragem de expectativas, o que, como o cachorro que corre atrás do próprio rabo, tornará mais difícil a tarefa do Banco Central de atingir a meta.

Agora, se o Banco Central for totalmente independente do Executivo, com mandatos descasados – por exemplo, o do Executivo termina em 2022, mas o mandato da diretoria do Banco Central apenas em 2024 –, essa dinâmica de expectativas perversa se dilui, e o objetivo inflacionário é atingido mais facilmente devido ao ganho de credibilidade. 

Esta coluna apoia o projeto de independência, mas faz uma espécie de advertência: essa reforma está longe de ser a prioridade do momento. Talvez seja fácil de aprovar, na medida em que custará pouco em termos de capital político despendido no processo. Ok. Mas independência do Banco Central não é mágica. Pouco adianta termos um Banco Central independente quando o equilíbrio fiscal vai se encaminhando perigosamente para o buraco.  É aí que mora o perigo. 


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