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Há tempos que nós brasileiros convivemos com o bizarro fenômeno das leis que não “pegam”. Leis que existem e que deveriam ser cumpridas ― mas não são. O mais grave nesses casos é que nada acontece com quem as descumpre. Se quebrar uma regra não traz nenhuma consequência, do ponto de vista prático, essa regra não vale.

O que isso tem a ver com a ação climática brasileira? Tudo! Usarei o exemplo do combate ao desmatamento na Amazônia — condição necessária, ainda que não suficiente, para reduzir as emissões brasileiras — para defender o argumento, que também se aplica a outros contextos.

O Brasil tem um complexo conjunto de regras que determina onde, quando e como uma área de vegetação nativa pode ser legalmente desmatada. Grande parte do desmatamento que acontece na Amazônia não segue essas regras, sendo, portanto, ilegal. É assim agora e já era assim vinte anos atrás, quando o governo federal lançou um plano de ação para combater o desmatamento na região. Um dos pilares desse plano de ação foi o fortalecimento do arcabouço de monitoramento e fiscalização. São esses, afinal, os principais instrumentos de política pública para enfrentar a ilegalidade.

Nesse contexto, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) desenvolveu um sistema inovador de monitoramento ambiental, que utilizava imagens de satélite para detectar alterações na cobertura vegetal e emitir alertas de perda florestal em tempo quase real. Esses alertas serviam para focalizar operações de fiscalização e aplicação da lei. Duas décadas depois, já nos acostumamos a ver notícias sobre os alertas de desmatamento na Amazônia, mas vale lembrar que o sistema foi absolutamente revolucionário quando implementado e é, ainda hoje, a peça-chave do controle ambiental na região.

O monitoramento por satélite aumentou a chance de infratores serem detectados e, portanto, responsabilizados. Além disso, diversas medidas adotadas no âmbito do plano de ação federal potencializaram a capacidade das autoridades ambientais de fiscalizar e aplicar punições efetivas, isto é, que doam no bolso dos infratores. Combinadas, essas inovações tecnológicas e de política pública tiveram um impacto imenso, impulsionando a acentuada queda na taxa de desmatamento na Amazônia a partir de 2004.

Voltando à ideia do primeiro parágrafo desta coluna: essas mudanças fizeram com que as leis “pegassem” mais. O infrator, que antes tinha certeza da impunidade, passou a enfrentar um risco maior de ser flagrado e punido. E punições como a destruição de maquinário implicam altos custos para quem desmata ou financia o desmatamento. Com isso, as consequências do descumprimento da lei tornaram-se mais concretas e custosas, fazendo com que potenciais infratores reconsiderassem a relação custo-benefício do desmatamento ilegal.

Cabe frisar que, apesar de terem se tornado mais efetivos, o monitoramento e a fiscalização ambientais não funcionavam perfeitamente e a impunidade na Amazônia não foi eliminada. Longe disso. Mas a melhora, ainda que imperfeita, na capacidade de aplicar a lei e os desdobramentos disso são muito informativos. Não basta que leis e conjunto de regras existam — é imprescindível que sejam aplicados para que sejam cumpridos.

A repercussão disso não se restringe apenas ao arcabouço de comando e controle ambientais, termo que contempla tanto o conjunto de regras quanto a sua aplicação. Todo o sistema de políticas públicas para combate ao desmatamento depende fundamentalmente do cumprimento de regras. Uma unidade de conservação, por exemplo, não é protegida por um muro ou um domo de vidro, mas por contar com um conjunto de normas que determinam uma punição mais severa para aqueles que descumprem a lei dentro desses territórios. Se essas normas não “pegam”, não há garantia nenhuma de proteção.

O fortalecimento do comando e do controle ambientais é, portanto, um alicerce da ação climática. Precisamos de leis e precisamos atuar para assegurar que elas sejam do tipo que “pegam”.

COLUNA PUBLICADA NA FOLHA DE S.PAULO 

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O Brasil e as leis que não “pegam”

Há tempos que nós brasileiros convivemos com o bizarro fenômeno das leis que não “pegam”. Leis que existem e que deveriam ser cumpridas ― mas não são. O mais grave nesses casos é que nada acontece com quem as descumpre. Se quebrar uma regra não traz nenhuma consequência, do ponto de vista prático, essa regra não vale.

O que isso tem a ver com a ação climática brasileira? Tudo! Usarei o exemplo do combate ao desmatamento na Amazônia — condição necessária, ainda que não suficiente, para reduzir as emissões brasileiras — para defender o argumento, que também se aplica a outros contextos.

O Brasil tem um complexo conjunto de regras que determina onde, quando e como uma área de vegetação nativa pode ser legalmente desmatada. Grande parte do desmatamento que acontece na Amazônia não segue essas regras, sendo, portanto, ilegal. É assim agora e já era assim vinte anos atrás, quando o governo federal lançou um plano de ação para combater o desmatamento na região. Um dos pilares desse plano de ação foi o fortalecimento do arcabouço de monitoramento e fiscalização. São esses, afinal, os principais instrumentos de política pública para enfrentar a ilegalidade.

Nesse contexto, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) desenvolveu um sistema inovador de monitoramento ambiental, que utilizava imagens de satélite para detectar alterações na cobertura vegetal e emitir alertas de perda florestal em tempo quase real. Esses alertas serviam para focalizar operações de fiscalização e aplicação da lei. Duas décadas depois, já nos acostumamos a ver notícias sobre os alertas de desmatamento na Amazônia, mas vale lembrar que o sistema foi absolutamente revolucionário quando implementado e é, ainda hoje, a peça-chave do controle ambiental na região.

O monitoramento por satélite aumentou a chance de infratores serem detectados e, portanto, responsabilizados. Além disso, diversas medidas adotadas no âmbito do plano de ação federal potencializaram a capacidade das autoridades ambientais de fiscalizar e aplicar punições efetivas, isto é, que doam no bolso dos infratores. Combinadas, essas inovações tecnológicas e de política pública tiveram um impacto imenso, impulsionando a acentuada queda na taxa de desmatamento na Amazônia a partir de 2004.

Voltando à ideia do primeiro parágrafo desta coluna: essas mudanças fizeram com que as leis “pegassem” mais. O infrator, que antes tinha certeza da impunidade, passou a enfrentar um risco maior de ser flagrado e punido. E punições como a destruição de maquinário implicam altos custos para quem desmata ou financia o desmatamento. Com isso, as consequências do descumprimento da lei tornaram-se mais concretas e custosas, fazendo com que potenciais infratores reconsiderassem a relação custo-benefício do desmatamento ilegal.

Cabe frisar que, apesar de terem se tornado mais efetivos, o monitoramento e a fiscalização ambientais não funcionavam perfeitamente e a impunidade na Amazônia não foi eliminada. Longe disso. Mas a melhora, ainda que imperfeita, na capacidade de aplicar a lei e os desdobramentos disso são muito informativos. Não basta que leis e conjunto de regras existam — é imprescindível que sejam aplicados para que sejam cumpridos.

A repercussão disso não se restringe apenas ao arcabouço de comando e controle ambientais, termo que contempla tanto o conjunto de regras quanto a sua aplicação. Todo o sistema de políticas públicas para combate ao desmatamento depende fundamentalmente do cumprimento de regras. Uma unidade de conservação, por exemplo, não é protegida por um muro ou um domo de vidro, mas por contar com um conjunto de normas que determinam uma punição mais severa para aqueles que descumprem a lei dentro desses territórios. Se essas normas não “pegam”, não há garantia nenhuma de proteção.

O fortalecimento do comando e do controle ambientais é, portanto, um alicerce da ação climática. Precisamos de leis e precisamos atuar para assegurar que elas sejam do tipo que “pegam”.

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