Uma plataforma que vai te ajudar a entender um pouco mais de economia.

2018 é ano de Copa do Mundo. E, um pouco antes dela, começa a febre dos álbuns de figurinhas. Isso nos dá uma oportunidade para falar um pouco sobre economia.

O caso das figurinhas é interessante, porque se trata de um mercado. Cheio de imperfeições, claro. E é nessas imperfeições que está a diversão. Explicamos.

O mercado é uma instituição que possibilita às pessoas fazerem trocas. Por exemplo, um arquiteto faz um projeto de uma casa e recebe dinheiro pelo serviço. Com o dinheiro, ele pode comprar as mais variadas coisas para si e sua família: comida, vestuário, casa, transporte etc. Note que ele trocou seu projeto de arquitetura por uma porção de outras coisas de que necessita, o que traz um enorme ganho de bem-estar. Ele não precisa gastar seu tempo escasso costurando as roupas para seus filhos, por exemplo. Além, é claro, de ter acesso a uma grande variedade de produtos e serviços.

O dinheiro tem um papel fundamental no funcionamento dos mercados modernos, pois ele dispensa a necessidade da tal “dupla coincidência de desejos”.

Pense em como seria o mercado sem dinheiro. O arquiteto, necessitando comprar roupas, precisaria achar um tecelão; e não apenas um tecelão, mas aquele que esteja disposto a receber um projeto de arquitetura em troca das roupas que produz. Parece quase impossível, certo?

Diante dessa dificuldade, o arquiteto teria que perder tempo produzindo as próprias roupas. Talvez nem se torne um arquiteto no fim das contas.

O dinheiro destrava esse mecanismo: o arquiteto recebe dinheiro por seus serviços e o utiliza para comprar roupas; o tecelão pode então usá-lo para comprar o que bem entende.

DE VOLTA ÀS FIGURINHAS

Completar um álbum de quase 700 cromos sem recorrer a trocas é uma tarefa difícil e custosa. No começo, quando o álbum ainda está vazio, a compra de alguns pacotes na banca de jornal lhe permite colar diversas figurinhas.

Mas, à medida que você vai preenchendo o álbum, começa a perceber que tem diversas figurinhas repetidas. É preciso trocá-las. Ou seja, ir ao mercado.

Por exemplo, você precisa da figurinha do Messi para completar a página da Argentina. Você então contata sua colega, que está com uma dificuldade enorme de encontrar o Neymar. Surpresa: você tem uma repetida do Neymar, e ela uma repetida do Messi.

Isso dá origem a uma troca. Note o ganho de bem-estar. Tanto você como sua colega saem ganhando nessa brincadeira, da mesma forma que o arquiteto e o tecelão no exemplo acima. Isso é chamado, em economia, de “jogo de soma não zero” — aquele em que uma ação conjunta permite que duas pessoas saiam ganhando.

Quanto maior o tamanho do mercado, mais fácil e barato fica completar o álbum. Com muitas pessoas colecionando figurinhas, o número de repetidas disponíveis no mercado é grande. Fica mais fácil encontrar alguém que queira sua figurinha e tenha alguma que você não tem – possibilitando assim a troca. Os ganhos de bem-estar são ainda maiores.


Veja como os avanços tecnológicos modernos aceleram esse processo. Hoje é muito mais fácil se comunicar – pelas redes sociais, por exemplo – e dizer de que cromos você dispõe e quais deseja.

Há inclusive grupos de WhatsApp especializados nisso. Muito diferente de algumas décadas atrás, quando era preciso procurar fisicamente as pessoas.
Isso permite que diversos mercados de figurinhas, que antes estavam segmentados, integrem-se, elevando os ganhos de troca. Mas há uma diferença fundamental em relação aos mercados modernos que descrevemos acima. A maior parte das trocas se dá diretamente, de figurinha por figurinha (o famoso escambo).

Apesar de haver gente que compra e vende cromos usando dinheiro, parece-me que essa não é a principal via de realizar transações. A introdução em massa de trocas em dinheiro certamente derrubaria muito os custos de completar o álbum. Por quê? Porque você simplesmente poderia comprar um conjunto de pacotes na banca, colocar aquelas que não tem em seu álbum e vender as suas repetidas no mercado. Com o dinheiro, compra aquelas que lhe faltam. Igualzinho ao caso do arquiteto e do tecelão descrito acima: não seria mais necessário chegar a uma dupla coincidência de desejos (no caso, encontrar alguém que queira sua repetida e possua uma figurinha que você não tem).

Imagine um mercado grande e integrado, com milhares de pessoas participando, e transações ocorrendo em dinheiro. Com algumas trocas você consegue muitas figurinhas que não tem. Em pouco tempo, seu álbum está completo. Um processo muito eficiente, certo? Mas incrivelmente chato.

Qual a graça de tudo isso? Não seria mais fácil simplesmente comprar um livro com as fotos dos jogadores, dos estádios, desenhos dos escudos etc.?

Em outras palavras, um mercado muito travado é ruim, pois você troca pouco e gasta muito dinheiro para completar o álbum. Mas um mercado superintegrado, com trocas muito fluidas, também não é um bom negócio, pois acabaria com a graça de colecionar. O processo de trocar figurinhas é divertido em si. São as próprias imperfeições desse mercado que o tornam interessante.

Publicado originalmente na Coluna do Por Quê? na Folha.com   

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O que as figurinhas da Copa ensinam sobre economia?

2018 é ano de Copa do Mundo. E, um pouco antes dela, começa a febre dos álbuns de figurinhas. Isso nos dá uma oportunidade para falar um pouco sobre economia.

O caso das figurinhas é interessante, porque se trata de um mercado. Cheio de imperfeições, claro. E é nessas imperfeições que está a diversão. Explicamos.

O mercado é uma instituição que possibilita às pessoas fazerem trocas. Por exemplo, um arquiteto faz um projeto de uma casa e recebe dinheiro pelo serviço. Com o dinheiro, ele pode comprar as mais variadas coisas para si e sua família: comida, vestuário, casa, transporte etc. Note que ele trocou seu projeto de arquitetura por uma porção de outras coisas de que necessita, o que traz um enorme ganho de bem-estar. Ele não precisa gastar seu tempo escasso costurando as roupas para seus filhos, por exemplo. Além, é claro, de ter acesso a uma grande variedade de produtos e serviços.

O dinheiro tem um papel fundamental no funcionamento dos mercados modernos, pois ele dispensa a necessidade da tal “dupla coincidência de desejos”.

Pense em como seria o mercado sem dinheiro. O arquiteto, necessitando comprar roupas, precisaria achar um tecelão; e não apenas um tecelão, mas aquele que esteja disposto a receber um projeto de arquitetura em troca das roupas que produz. Parece quase impossível, certo?

Diante dessa dificuldade, o arquiteto teria que perder tempo produzindo as próprias roupas. Talvez nem se torne um arquiteto no fim das contas.

O dinheiro destrava esse mecanismo: o arquiteto recebe dinheiro por seus serviços e o utiliza para comprar roupas; o tecelão pode então usá-lo para comprar o que bem entende.



DE VOLTA ÀS FIGURINHAS

Completar um álbum de quase 700 cromos sem recorrer a trocas é uma tarefa difícil e custosa. No começo, quando o álbum ainda está vazio, a compra de alguns pacotes na banca de jornal lhe permite colar diversas figurinhas.

Mas, à medida que você vai preenchendo o álbum, começa a perceber que tem diversas figurinhas repetidas. É preciso trocá-las. Ou seja, ir ao mercado.

Por exemplo, você precisa da figurinha do Messi para completar a página da Argentina. Você então contata sua colega, que está com uma dificuldade enorme de encontrar o Neymar. Surpresa: você tem uma repetida do Neymar, e ela uma repetida do Messi.

Isso dá origem a uma troca. Note o ganho de bem-estar. Tanto você como sua colega saem ganhando nessa brincadeira, da mesma forma que o arquiteto e o tecelão no exemplo acima. Isso é chamado, em economia, de “jogo de soma não zero” — aquele em que uma ação conjunta permite que duas pessoas saiam ganhando.

Quanto maior o tamanho do mercado, mais fácil e barato fica completar o álbum. Com muitas pessoas colecionando figurinhas, o número de repetidas disponíveis no mercado é grande. Fica mais fácil encontrar alguém que queira sua figurinha e tenha alguma que você não tem – possibilitando assim a troca. Os ganhos de bem-estar são ainda maiores.


Veja como os avanços tecnológicos modernos aceleram esse processo. Hoje é muito mais fácil se comunicar – pelas redes sociais, por exemplo – e dizer de que cromos você dispõe e quais deseja.

Há inclusive grupos de WhatsApp especializados nisso. Muito diferente de algumas décadas atrás, quando era preciso procurar fisicamente as pessoas.
Isso permite que diversos mercados de figurinhas, que antes estavam segmentados, integrem-se, elevando os ganhos de troca. Mas há uma diferença fundamental em relação aos mercados modernos que descrevemos acima. A maior parte das trocas se dá diretamente, de figurinha por figurinha (o famoso escambo).

Apesar de haver gente que compra e vende cromos usando dinheiro, parece-me que essa não é a principal via de realizar transações. A introdução em massa de trocas em dinheiro certamente derrubaria muito os custos de completar o álbum. Por quê? Porque você simplesmente poderia comprar um conjunto de pacotes na banca, colocar aquelas que não tem em seu álbum e vender as suas repetidas no mercado. Com o dinheiro, compra aquelas que lhe faltam. Igualzinho ao caso do arquiteto e do tecelão descrito acima: não seria mais necessário chegar a uma dupla coincidência de desejos (no caso, encontrar alguém que queira sua repetida e possua uma figurinha que você não tem).

Imagine um mercado grande e integrado, com milhares de pessoas participando, e transações ocorrendo em dinheiro. Com algumas trocas você consegue muitas figurinhas que não tem. Em pouco tempo, seu álbum está completo. Um processo muito eficiente, certo? Mas incrivelmente chato.

Qual a graça de tudo isso? Não seria mais fácil simplesmente comprar um livro com as fotos dos jogadores, dos estádios, desenhos dos escudos etc.?

Em outras palavras, um mercado muito travado é ruim, pois você troca pouco e gasta muito dinheiro para completar o álbum. Mas um mercado superintegrado, com trocas muito fluidas, também não é um bom negócio, pois acabaria com a graça de colecionar. O processo de trocar figurinhas é divertido em si. São as próprias imperfeições desse mercado que o tornam interessante.

Publicado originalmente na Coluna do Por Quê? na Folha.com   


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