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General Mourão, vice na chapa de Jair Bolsonaro (PSL), voltou a se opor ao 13º salário.  Há alguns dias, ele e Geraldo Alckmin (PSDB), candidato à Presidência, já haviam se colocado de lados opostos nessa discussão.

O problema de tomar lado nesse debate é que, na verdade, não existem lados. O 13º salário não ajuda o trabalhador, mas a sua eliminação tampouco beneficia o empregador.

O maior problema com essa história do 13º é que, por algum motivo, nosso cérebro não é muito bom com frações. Coisas como 13/12 avos a gente acha meio esquisito de visualizar. Mas se não pararmos no 13 e formos direto até o 24, a ficha cai. Imagine-se num mundo em que todos recebem 12 salários mensais ao longo de um ano. Aí, de chofre, em outubro o governo anuncia que a partir de janeiro do ano seguinte, o trabalhador passará a receber 24 salários! E então, leitor, o trabalhador estará mais rico?  Não é difícil perceber que não pode ser. Uma mudança dessas não tem como gerar aumento de salários; só o que acontecerá é que os novos salários serão metade do que eram. Similarmente, pensemos agora que o arranjo inicial é de 24 salários pagos no ano (parecido com o que rola nos EUA). Se vem um novo presidente e muda para 12 salários, estará ele prejudicando a classe trabalhadora? Claro que não, o salário recebido agora será o dobro, totalizando o mesmo montante no final das contas.

Agora diga: qual a diferença entre esse exemplo e o do 13º? Nenhuma. Quando a razão é 2 ou ½, é mais fácil visualizar do que quando ela é 12/13 ou 13/12. O 13º salário não aumenta renda de ninguém - ah, se fosse tão fácil aumentar a renda das pessoas!

A renda do trabalhador é determinada por quanto ele é produtivo, e também pela estrutura de concorrência no mercado de trabalho. Se há poucas firmas contratando, o salário será menor mesmo, por falta de concorrência entre as firmas por trabalhadores. O nome para isso é feíssimo: chama-se “monopsônio”, mas não tem qualquer relação com 13, 14 ou 37 salários pagos.

Há uma possibilidade, no entanto, de o 13º salário ajudar as pessoas. Não no sentido de aumentar sua renda, claro, mas na dimensão organizacional. No fim do ano os gastos se acumulam no tempo: contas que vencem e festas e farras que demandam recursos. Claro, um ser humano perfeitamente racional pouparia parte dos seus doze salários para fazer frente a esses gastos. Mas, sabe como é, "dinheiro na mão é vendaval": a gente se programa mal, gasta tudo de uma vez, e acaba se atrapalhando. Portanto, melhor receber uma boa parte da renda anual justamente quando vêm as contas -- é pá-bum, entrou-gastou. Em economia comportamental, coisas como "dinheiro na mão é vendaval" recebem o nome chique de inconsistência temporal. Similarmente, se o trabalhador recebesse apenas seis salários anuais não ficaria mais pobre,  mas seria um arranjo ruim no sentido de dificultar a organização do tão desorganizado ser humano. No mês em que a bolada entrasse, mil maravilhas. "Tô cheio de grana!". Nos meses seguintes, aperto total...

Por fim, no bojo desse debate, houve economista dizendo que a coisa de ter 12 ou 13 salários importa sim, mas apenas para quem ganha ali muito perto do mínimo. O raciocínio é o seguinte: se o sujeito ganha 13 salários mínimos de R$ 800 cada, mas o empregador na verdade gostaria de pagar-lhe 13 parcelas de R$ 600 e só não o faz porque não pode legalmente, quando reduzimos o número de pagamentos o empregador teria uma brecha legal para reduzir o salário total do trabalhador: basta manter o valor por pagamento igual a 800. Como agora são desembolsados 12 pagamentos apenas, o salário total seria reduzido. Nonada! Isso aí é muito fácil de consertar. Basta impor um salário mínimo em bases anuais, em vez de mensais. Por exemplo, para mantermos aquele valor inicial, o governo decretaria um mínimo de 13 x R$ 800, ou seja, R$ 10.400 por ano. Pago em 13 vezes de R$ 800 ou 12 vezes de R$ 867 (10.400/12) ou oito vezes de R$ 1.300 (10.400/80), etc., etc., etc...

Enfim, o 13º salário é uma ficção. Pode ajudar você a se organizar, mas não incrementa sua renda. Não se deixe enganar com discursos que não respeitam a aritmética.

Publicado originalmente na Coluna do Por Quê? na Folha de S.Paulo

 

Por que o 13º salário pouco importa?

General Mourão, vice na chapa de Jair Bolsonaro (PSL), voltou a se opor ao 13º salário.  Há alguns dias, ele e Geraldo Alckmin (PSDB), candidato à Presidência, já haviam se colocado de lados opostos nessa discussão. O problema de tomar lado nesse debate é que, na verdade, não existem lados. O 13º salário não ajuda o trabalhador, mas a sua eliminação tampouco beneficia o empregador. O maior problema com essa história do 13º é que, por algum motivo, nosso cérebro não é muito bom com frações. Coisas como 13/12 avos a gente acha meio esquisito de visualizar. Mas se não pararmos no 13 e formos direto até o 24, a ficha cai. Imagine-se num mundo em que todos recebem 12 salários mensais ao longo de um ano. Aí, de chofre, em outubro o governo anuncia que a partir de janeiro do ano seguinte, o trabalhador passará a receber 24 salários! E então, leitor, o trabalhador estará mais rico?  Não é difícil perceber que não pode ser. Uma mudança dessas não tem como gerar aumento de salários; só o que acontecerá é que os novos salários serão metade do que eram. Similarmente, pensemos agora que o arranjo inicial é de 24 salários pagos no ano (parecido com o que rola nos EUA). Se vem um novo presidente e muda para 12 salários, estará ele prejudicando a classe trabalhadora? Claro que não, o salário recebido agora será o dobro, totalizando o mesmo montante no final das contas. Agora diga: qual a diferença entre esse exemplo e o do 13º? Nenhuma. Quando a razão é 2 ou ½, é mais fácil visualizar do que quando ela é 12/13 ou 13/12. O 13º salário não aumenta renda de ninguém - ah, se fosse tão fácil aumentar a renda das pessoas! A renda do trabalhador é determinada por quanto ele é produtivo, e também pela estrutura de concorrência no mercado de trabalho. Se há poucas firmas contratando, o salário será menor mesmo, por falta de concorrência entre as firmas por trabalhadores. O nome para isso é feíssimo: chama-se “monopsônio”, mas não tem qualquer relação com 13, 14 ou 37 salários pagos. Há uma possibilidade, no entanto, de o 13º salário ajudar as pessoas. Não no sentido de aumentar sua renda, claro, mas na dimensão organizacional. No fim do ano os gastos se acumulam no tempo: contas que vencem e festas e farras que demandam recursos. Claro, um ser humano perfeitamente racional pouparia parte dos seus doze salários para fazer frente a esses gastos. Mas, sabe como é, "dinheiro na mão é vendaval": a gente se programa mal, gasta tudo de uma vez, e acaba se atrapalhando. Portanto, melhor receber uma boa parte da renda anual justamente quando vêm as contas -- é pá-bum, entrou-gastou. Em economia comportamental, coisas como "dinheiro na mão é vendaval" recebem o nome chique de inconsistência temporal. Similarmente, se o trabalhador recebesse apenas seis salários anuais não ficaria mais pobre,  mas seria um arranjo ruim no sentido de dificultar a organização do tão desorganizado ser humano. No mês em que a bolada entrasse, mil maravilhas. "Tô cheio de grana!". Nos meses seguintes, aperto total... Por fim, no bojo desse debate, houve economista dizendo que a coisa de ter 12 ou 13 salários importa sim, mas apenas para quem ganha ali muito perto do mínimo. O raciocínio é o seguinte: se o sujeito ganha 13 salários mínimos de R$ 800 cada, mas o empregador na verdade gostaria de pagar-lhe 13 parcelas de R$ 600 e só não o faz porque não pode legalmente, quando reduzimos o número de pagamentos o empregador teria uma brecha legal para reduzir o salário total do trabalhador: basta manter o valor por pagamento igual a 800. Como agora são desembolsados 12 pagamentos apenas, o salário total seria reduzido. Nonada! Isso aí é muito fácil de consertar. Basta impor um salário mínimo em bases anuais, em vez de mensais. Por exemplo, para mantermos aquele valor inicial, o governo decretaria um mínimo de 13 x R$ 800, ou seja, R$ 10.400 por ano. Pago em 13 vezes de R$ 800 ou 12 vezes de R$ 867 (10.400/12) ou oito vezes de R$ 1.300 (10.400/80), etc., etc., etc... Enfim, o 13º salário é uma ficção. Pode ajudar você a se organizar, mas não incrementa sua renda. Não se deixe enganar com discursos que não respeitam a aritmética. Publicado originalmente na Coluna do Por Quê? na Folha de S.Paulo  
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