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Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

(Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

No final de 2017, veículos de comunicação e políticos fizeram grande alarde dos números de criação de empregos do Brasil ao longo do mês de novembro. A divulgação ocorre todos os meses, mas aqueles dados receberam destaque especial. Isso porque era o primeiro mês em que a reforma trabalhista estava em vigor e, apesar dela, o número de empregos havia caído. E nesta semana a Folha de S.Paulo informou que os dados oficiais de dezembro virão ainda piores quando divulgados.

Apenas com essas informações, todavia, não é possível concluir que há relação entre a reforma e a queda nos postos de trabalho observada ao longo desses meses. Explicamos.

Em análises teóricas, economistas lançam mão de modelos em que vários aspectos da realidade são simplificados para permitir que se obtenham resultados claros e intuitivos. Como o mundo real é muito complexo, modelos com todos os detalhes seriam complicados e inúteis, pois não gerariam nenhum resultado que pudesse ser confrontado com os dados.

Uma das ferramentas nessa simplificação é o "ceteris paribus", expressão latina que significa “tudo o mais é constante”, “tudo o mais permanece igual”. Um exemplo de aplicação desse conceito: gostaríamos de saber se a flexibilização das leis trabalhistas aumenta ou não o emprego. Para isso, elaboramos um modelo tentando descrever os comportamentos de empregadores e empregados e como suas decisões interagem no mercado, em função da legislação.

Dentro do modelo, o efeito da legislação pode então ser captado por uma alteração nessa variável. É aqui que entra o "ceteris paribus". Variamos apenas o grau de rigidez da legislação, e nada mais. Isso é útil, pois permite captar o impacto apenas dessa variável, isolando a análise de outros fatores que porventura mexam com o emprego.

No entanto, quando passamos à análise empírica para avaliar o mecanismo teórico, temos um desafio: nos dados não há "ceteris paribus". Outras variáveis não estão paradas. Diversos outros fatores podem impactar a estatística de emprego, além da legislação trabalhista. Como saber se o que observamos foi resultado da política, e não de outras variáveis que estão se mexendo?

Por isso olhar para o dado bruto de emprego em um mês não nos diz muito sobre o efeito de um fator como a legislação trabalhista.

Um exemplo desse fator adicional é sazonalidade. Ao longo de todo ano, há meses em que a atividade tipicamente é mais fraca, e outros em que é mais pujante. E novembro e dezembro são meses tradicionalmente mais fracos para emprego.

Se expurgarmos o efeito sazonal, notamos um pequeno aumento no emprego em novembro (veja mais aqui e aqui. Novamente, pelos motivos acima levantados, não dá para colocar isso na conta da reforma trabalhista.

Na verdade, de modo geral, esse tipo de análise equivocada, em que se considera um dado agregado para avaliar o efeito de uma política, ocorre frequentemente e em diversos contextos. No PorQue.com.br, por exemplo, já tivemos  discussões nessa linha para o caso da cobrança de bagagens e preço das passagens aéreas e para o caso do limite de velocidades das marginais paulistanas e número de acidentes letais.

Para avaliar de maneira rigorosa os efeitos de uma política pública, recorre-se a "experimentos aleatórios controlados". Basicamente, selecionam-se dois grupos de indivíduos – um que será exposto à política, chamado de “grupo de tratamento”, e outro que servirá como comparação, não sendo exposto à política, chamado “grupo de controle”. A definição de quem fará parte de cada grupo é dada por sorteio aleatório.

O efeito da política pode ser estimado pela diferença média entre os grupos. Fatores que afetam a todos os indivíduos ao mesmo tempo, assim, cancelam-se na comparação. É o mais próximo que conseguimos chegar da ideia de "ceteris paribus".

Veja, como exemplo, o artigo de Nina Cunha e coautores, que recentemente discutimos. Eles avaliam o efeito de informar pais de alunos sobre sua frequência na escola, com base em dados da rede pública do estado de São Paulo. Para tanto, consideram um grupo de tratamento, com crianças cujos pais passaram a receber periodicamente mensagens de SMS com informações sobre o número de faltas de seus filhos, e um grupo de controle com alunos cujos pais não receberam essas mensagens.

O efeito da intervenção é a diferença média (em termos de frequência e desempenho escolar) entre os dois grupos. Os autores encontraram efeitos significativos nessas dimensões.

Entretanto, quando olhamos dados agregados, com a política valendo para todo mundo (como no caso da reforma trabalhista), é muito mais difícil lançar mão de uma técnica como a descrita acima. No mundo da macroeconomia, raramente há experimentos controlados.

Trata-se de uma questão de grande relevância. Certamente, no futuro, alguém encontrará uma forma criativa de avaliar com rigor a política, mesmo sem a possibilidade de recorrer a experimentos controlados. Por ora não dá para afirmar muita coisa com base na informação disponível. Haja vista que faz pouquíssimo tempo que a reforma foi implantada.

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O texto acima é uma versão atualizada da publicação original da Coluna do Por Quê? na Folha.com

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Reforma trabalhista causou desemprego em novembro e dezembro?

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil) No final de 2017, veículos de comunicação e políticos fizeram grande alarde dos números de criação de empregos do Brasil ao longo do mês de novembro. A divulgação ocorre todos os meses, mas aqueles dados receberam destaque especial. Isso porque era o primeiro mês em que a reforma trabalhista estava em vigor e, apesar dela, o número de empregos havia caído. E nesta semana a Folha de S.Paulo informou que os dados oficiais de dezembro virão ainda piores quando divulgados. Apenas com essas informações, todavia, não é possível concluir que há relação entre a reforma e a queda nos postos de trabalho observada ao longo desses meses. Explicamos. Em análises teóricas, economistas lançam mão de modelos em que vários aspectos da realidade são simplificados para permitir que se obtenham resultados claros e intuitivos. Como o mundo real é muito complexo, modelos com todos os detalhes seriam complicados e inúteis, pois não gerariam nenhum resultado que pudesse ser confrontado com os dados. Uma das ferramentas nessa simplificação é o "ceteris paribus", expressão latina que significa “tudo o mais é constante”, “tudo o mais permanece igual”. Um exemplo de aplicação desse conceito: gostaríamos de saber se a flexibilização das leis trabalhistas aumenta ou não o emprego. Para isso, elaboramos um modelo tentando descrever os comportamentos de empregadores e empregados e como suas decisões interagem no mercado, em função da legislação. Dentro do modelo, o efeito da legislação pode então ser captado por uma alteração nessa variável. É aqui que entra o "ceteris paribus". Variamos apenas o grau de rigidez da legislação, e nada mais. Isso é útil, pois permite captar o impacto apenas dessa variável, isolando a análise de outros fatores que porventura mexam com o emprego. No entanto, quando passamos à análise empírica para avaliar o mecanismo teórico, temos um desafio: nos dados não há "ceteris paribus". Outras variáveis não estão paradas. Diversos outros fatores podem impactar a estatística de emprego, além da legislação trabalhista. Como saber se o que observamos foi resultado da política, e não de outras variáveis que estão se mexendo? Por isso olhar para o dado bruto de emprego em um mês não nos diz muito sobre o efeito de um fator como a legislação trabalhista. Um exemplo desse fator adicional é sazonalidade. Ao longo de todo ano, há meses em que a atividade tipicamente é mais fraca, e outros em que é mais pujante. E novembro e dezembro são meses tradicionalmente mais fracos para emprego. Se expurgarmos o efeito sazonal, notamos um pequeno aumento no emprego em novembro (veja mais aqui e aqui. Novamente, pelos motivos acima levantados, não dá para colocar isso na conta da reforma trabalhista. Na verdade, de modo geral, esse tipo de análise equivocada, em que se considera um dado agregado para avaliar o efeito de uma política, ocorre frequentemente e em diversos contextos. No PorQue.com.br, por exemplo, já tivemos  discussões nessa linha para o caso da cobrança de bagagens e preço das passagens aéreas e para o caso do limite de velocidades das marginais paulistanas e número de acidentes letais. Para avaliar de maneira rigorosa os efeitos de uma política pública, recorre-se a "experimentos aleatórios controlados". Basicamente, selecionam-se dois grupos de indivíduos – um que será exposto à política, chamado de “grupo de tratamento”, e outro que servirá como comparação, não sendo exposto à política, chamado “grupo de controle”. A definição de quem fará parte de cada grupo é dada por sorteio aleatório. O efeito da política pode ser estimado pela diferença média entre os grupos. Fatores que afetam a todos os indivíduos ao mesmo tempo, assim, cancelam-se na comparação. É o mais próximo que conseguimos chegar da ideia de "ceteris paribus". Veja, como exemplo, o artigo de Nina Cunha e coautores, que recentemente discutimos. Eles avaliam o efeito de informar pais de alunos sobre sua frequência na escola, com base em dados da rede pública do estado de São Paulo. Para tanto, consideram um grupo de tratamento, com crianças cujos pais passaram a receber periodicamente mensagens de SMS com informações sobre o número de faltas de seus filhos, e um grupo de controle com alunos cujos pais não receberam essas mensagens. O efeito da intervenção é a diferença média (em termos de frequência e desempenho escolar) entre os dois grupos. Os autores encontraram efeitos significativos nessas dimensões. Entretanto, quando olhamos dados agregados, com a política valendo para todo mundo (como no caso da reforma trabalhista), é muito mais difícil lançar mão de uma técnica como a descrita acima. No mundo da macroeconomia, raramente há experimentos controlados. Trata-se de uma questão de grande relevância. Certamente, no futuro, alguém encontrará uma forma criativa de avaliar com rigor a política, mesmo sem a possibilidade de recorrer a experimentos controlados. Por ora não dá para afirmar muita coisa com base na informação disponível. Haja vista que faz pouquíssimo tempo que a reforma foi implantada. * O texto acima é uma versão atualizada da publicação original da Coluna do Por Quê? na Folha.com * Para ficar por dentro do que rola no Por Quê?, clique aqui e assine a nossa Newsletter.
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