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							No último texto desta série explicamos como as externalidades aparecem em economia ambiental, mencionando o problema da tragédia dos comuns (ou seja, a situação em que livre acesso, alta demanda e ausência de direitos claros de propriedade resultam no esgotamento de um recurso renovável). Hoje vamos apresentar uma possível solução para as externalidades: o imposto.

Como discutimos anteriormente, o problema das externalidades ocorre quando pessoas tomam decisões individuais sem levar em conta o custo dessas decisões para os demais. O imposto é um dos mecanismos que surgem para alinhar os benefícios e custos do indivíduo aos da sociedade, ou, em outras palavras, forçar os agentes a “internalizarem” as externalidades.
Como isso vai funcionar na prática?
Vamos pensar no exemplo de uma universitária, Larissa, que costuma comprar uma garrafinha de água toda manhã na cantina da faculdade.

Em uma tentativa de diminuir a quantidade de plástico produzido no mundo, o governo pode colocar um imposto sobre esse material. Então, se antes Larissa pagava uma determinada quantia pela sua garrafinha todos os dias, agora vai precisar pagar mais se quiser manter o hábito.

O imposto entra então aumentando o preço de produtos e serviços. Quando os bens ficam mais caros, as pessoas podem escolher consumir menos daqueles bens ou serviços ou migrar para alternativas. Larissa pode parar de jogar fora a garrafinha de plástico e passar a reabastecê-la, usando o dinheiro que gastaria com ela em outra coisa. Ou pode comprar água de outra marca, que use embalagem de papelão, por exemplo.

Caso várias pessoas reajam ao imposto dessa maneira, menos plástico será consumido, tornando o total mais próximo ou igual ao ótimo social. A ideia então é que o imposto vai alinhar o que é bom para o indivíduo e aquilo que é ruim para a sociedade.

Empresas e indivíduos escolhem consumir/produzir bens e serviços que gerem poluição porque poluição não tem custo. Se o governo aumentar o preço de poluir, vai criar incentivos para mudar o comportamento de empresas e indivíduos e diminuir a poluição.

Esse tipo de imposto sobre poluição existe na prática em alguns países. A Dinamarca, por exemplo, tem posto em ação vários mecanismos para possibilitar uma “reforma tributária verde” que auxilie na mitigação dos efeitos climáticos. Um exemplo é o imposto anual que todos os donos de carro residentes no país devem pagar. O valor é calculado com base no consumo de combustível de cada veículo, e por isso carros mais eficientes têm reduções nas tarifas. Esse imposto foi implementado justamente para tentar reduzir o impacto ambiental provocado pelos carros. De fato, vários estudos confirmam que o efeito desses impostos é significativo para diminuir o consumo de combustível fóssil e a eficiência energética do país.
Porém, é importante falar que impostos nem sempre são a melhor maneira de evitar a poluição/depredação ambiental.

Em primeiro lugar, porque a tributação não é uma medida popular. Repare que em campanhas eleitorais sempre há candidatos prometendo diminuir impostos. São vários os motivos por trás disso. No dia a dia, sempre vemos alguém reclamar que impostos sobre consumo deixam alguns produtos bem caros. Ninguém gosta de pagar mais, seja um indivíduo ao fazer uma compra, seja uma empresa ao analisar os custos da produção de alguma coisa. Outro problema é que impostos que recaiam na folha de pagamento desestimulam a contratação, podendo gerar desemprego. E ainda, por causa das frequentes denúncias de corrupção no Brasil, muitos não confiam que o governo vai alocar de forma correta a arrecadação que virá desses impostos (por exemplo, investindo em bens públicos). Então, é bem difícil imaginar alguém defendendo o aumento de impostos numa campanha eleitoral, e nem sempre esse tipo de política passa com facilidade na câmara.

Além disso, é bem complexo prever como as pessoas vão reagir aos impostos. Vários economistas estudam esse tema, buscando estimar a demanda das pessoas em diferentes mercados para tentar prever como indivíduos vão reagir a aumento de preços. O que pode acontecer se, por exemplo, colocarmos um imposto sobre a carne (pensando em diminuir emissões de metano na atmosfera)? Bom, pode ser que as pessoas aceitem pagar mais e continuem comendo tanta carne como comem hoje (e a poluição continue a mesma), ou pode ser que o consumo diminua. Não é fácil prever.

Mas se a gente supuser que as pessoas vão comer menos carne, o que vão consumir no lugar? Será que não pode acontecer de essas pessoas consumirem alimentos que têm impacto ecológico ainda maior? Ou, não estando bem informadas sobre a alimentação vegetariana, começarem a comer alimentos até mais “limpos” para o meio ambiente, mas nada saudáveis? Se esse for o caso, não podemos ter um aumento de doenças causadas pela má alimentação?

No Brasil, há outro desafio importante que se deve considerar antes de pensar em desenhar políticas públicas que usem imposto para corrigir externalidades: a desigualdade. Muitas vezes, pessoas com menos recursos financeiros são as que vão pagar o ônus dos impostos. Seja porque não conseguem alternativas para produtos e serviços taxados, sendo obrigadas a pagar pelas externalidades, seja porque perdem o acesso a esses produtos e serviços quando o preço fica alto (e muitas vezes isso acontece com bens essenciais, como transporte e alimentação). Não é difícil imaginar que um imposto sobre a carne, por exemplo, possa levar vários brasileiros à fome. Então, políticas que envolvam impostos precisam ser muito bem pensadas para que o retorno dos custos das externalidades caia de forma diferenciada (isto é, não gere problemas tão ruins quanto as externalidades iniciais, por afetar mais os mais pobres e menos os mais ricos).

Em resumo, o imposto em externalidades ambientais seria uma forma de alocar estrategicamente ativos naturais do Brasil, alinhando os incentivos da empresa e dos consumidores com a sociedade no longo prazo. No entanto, são vários os desafios para que sejam introduzidos de forma adequada. Nos próximos textos do Por Quê?, falaremos de soluções complementares e alternativas aos impostos, que também podem auxiliar na resolução do problema das externalidades ambientais.

Luiza Martins Karpavicius
Economista formada pela FEA-USP. Trabalha na área de economia do meio ambiente e dos recursos naturais. É mestre pela Universidade de Copenhague e doutoranda na Universidade de Aarhus, na Dinamarca.

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O problema das externalidades e o imposto

No último texto desta série explicamos como as externalidades aparecem em economia ambiental, mencionando o problema da tragédia dos comuns (ou seja, a situação em que livre acesso, alta demanda e ausência de direitos claros de propriedade resultam no esgotamento de um recurso renovável). Hoje vamos apresentar uma possível solução para as externalidades: o imposto.

Como discutimos anteriormente, o problema das externalidades ocorre quando pessoas tomam decisões individuais sem levar em conta o custo dessas decisões para os demais. O imposto é um dos mecanismos que surgem para alinhar os benefícios e custos do indivíduo aos da sociedade, ou, em outras palavras, forçar os agentes a “internalizarem” as externalidades.
Como isso vai funcionar na prática?
Vamos pensar no exemplo de uma universitária, Larissa, que costuma comprar uma garrafinha de água toda manhã na cantina da faculdade.

Em uma tentativa de diminuir a quantidade de plástico produzido no mundo, o governo pode colocar um imposto sobre esse material. Então, se antes Larissa pagava uma determinada quantia pela sua garrafinha todos os dias, agora vai precisar pagar mais se quiser manter o hábito.

O imposto entra então aumentando o preço de produtos e serviços. Quando os bens ficam mais caros, as pessoas podem escolher consumir menos daqueles bens ou serviços ou migrar para alternativas. Larissa pode parar de jogar fora a garrafinha de plástico e passar a reabastecê-la, usando o dinheiro que gastaria com ela em outra coisa. Ou pode comprar água de outra marca, que use embalagem de papelão, por exemplo.

Caso várias pessoas reajam ao imposto dessa maneira, menos plástico será consumido, tornando o total mais próximo ou igual ao ótimo social. A ideia então é que o imposto vai alinhar o que é bom para o indivíduo e aquilo que é ruim para a sociedade.

Empresas e indivíduos escolhem consumir/produzir bens e serviços que gerem poluição porque poluição não tem custo. Se o governo aumentar o preço de poluir, vai criar incentivos para mudar o comportamento de empresas e indivíduos e diminuir a poluição.

Esse tipo de imposto sobre poluição existe na prática em alguns países. A Dinamarca, por exemplo, tem posto em ação vários mecanismos para possibilitar uma “reforma tributária verde” que auxilie na mitigação dos efeitos climáticos. Um exemplo é o imposto anual que todos os donos de carro residentes no país devem pagar. O valor é calculado com base no consumo de combustível de cada veículo, e por isso carros mais eficientes têm reduções nas tarifas. Esse imposto foi implementado justamente para tentar reduzir o impacto ambiental provocado pelos carros. De fato, vários estudos confirmam que o efeito desses impostos é significativo para diminuir o consumo de combustível fóssil e a eficiência energética do país.
Porém, é importante falar que impostos nem sempre são a melhor maneira de evitar a poluição/depredação ambiental.

Em primeiro lugar, porque a tributação não é uma medida popular. Repare que em campanhas eleitorais sempre há candidatos prometendo diminuir impostos. São vários os motivos por trás disso. No dia a dia, sempre vemos alguém reclamar que impostos sobre consumo deixam alguns produtos bem caros. Ninguém gosta de pagar mais, seja um indivíduo ao fazer uma compra, seja uma empresa ao analisar os custos da produção de alguma coisa. Outro problema é que impostos que recaiam na folha de pagamento desestimulam a contratação, podendo gerar desemprego. E ainda, por causa das frequentes denúncias de corrupção no Brasil, muitos não confiam que o governo vai alocar de forma correta a arrecadação que virá desses impostos (por exemplo, investindo em bens públicos). Então, é bem difícil imaginar alguém defendendo o aumento de impostos numa campanha eleitoral, e nem sempre esse tipo de política passa com facilidade na câmara.

Além disso, é bem complexo prever como as pessoas vão reagir aos impostos. Vários economistas estudam esse tema, buscando estimar a demanda das pessoas em diferentes mercados para tentar prever como indivíduos vão reagir a aumento de preços. O que pode acontecer se, por exemplo, colocarmos um imposto sobre a carne (pensando em diminuir emissões de metano na atmosfera)? Bom, pode ser que as pessoas aceitem pagar mais e continuem comendo tanta carne como comem hoje (e a poluição continue a mesma), ou pode ser que o consumo diminua. Não é fácil prever.

Mas se a gente supuser que as pessoas vão comer menos carne, o que vão consumir no lugar? Será que não pode acontecer de essas pessoas consumirem alimentos que têm impacto ecológico ainda maior? Ou, não estando bem informadas sobre a alimentação vegetariana, começarem a comer alimentos até mais “limpos” para o meio ambiente, mas nada saudáveis? Se esse for o caso, não podemos ter um aumento de doenças causadas pela má alimentação?

No Brasil, há outro desafio importante que se deve considerar antes de pensar em desenhar políticas públicas que usem imposto para corrigir externalidades: a desigualdade. Muitas vezes, pessoas com menos recursos financeiros são as que vão pagar o ônus dos impostos. Seja porque não conseguem alternativas para produtos e serviços taxados, sendo obrigadas a pagar pelas externalidades, seja porque perdem o acesso a esses produtos e serviços quando o preço fica alto (e muitas vezes isso acontece com bens essenciais, como transporte e alimentação). Não é difícil imaginar que um imposto sobre a carne, por exemplo, possa levar vários brasileiros à fome. Então, políticas que envolvam impostos precisam ser muito bem pensadas para que o retorno dos custos das externalidades caia de forma diferenciada (isto é, não gere problemas tão ruins quanto as externalidades iniciais, por afetar mais os mais pobres e menos os mais ricos).

Em resumo, o imposto em externalidades ambientais seria uma forma de alocar estrategicamente ativos naturais do Brasil, alinhando os incentivos da empresa e dos consumidores com a sociedade no longo prazo. No entanto, são vários os desafios para que sejam introduzidos de forma adequada. Nos próximos textos do Por Quê?, falaremos de soluções complementares e alternativas aos impostos, que também podem auxiliar na resolução do problema das externalidades ambientais.

Luiza Martins Karpavicius
Economista formada pela FEA-USP. Trabalha na área de economia do meio ambiente e dos recursos naturais. É mestre pela Universidade de Copenhague e doutoranda na Universidade de Aarhus, na Dinamarca.

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