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Roger Federer of Switzerland serves to Guido Pella of Argentina during their men's singles match on day one of the Wimbledon Tennis Championships in London, Monday, June 27, 2016. (AP Photo/Alastair Grant)

Na edição de Wimbledon deste ano, um dos principais torneios de tênis do mundo, notou-se um fato preocupante: a ocorrência desproporcional de desistências, principalmente, na primeira rodada da competição. Aparentemente, a tendência vem de alguns anos para cá, mas neste ano mais de 10% das partidas masculinas da primeira rodada foram encerradas pela desistência de algum jogador. O tenista alega que está machucado ou com algum problema físico, e entrega a partida ao adversário.

Isso, obviamente, não é bom para o torneio. Fãs gastam muito dinheiro para acompanhar as partidas de seus ídolos, e se deparam com jogos encerrados após uma hora ou menos. Para a TV e os patrocinadores, que pagam uma fortuna pelos direitos de transmissão e para terem seus nomes associados ao torneio, também não é um bom negócio.

A recorrência das contusões tem gerado suspeitas de que várias delas não são verdadeiras.

Alegar uma contusão pode ser vantajoso para em algumas situações. Se, no meio da partida, o jogador sentir que suas chances de ganhar são muito pequenas, pode fazer sentido entregar os pontos. Por que se desgastar e arrastar o jogo até o final? Pode ser melhor encerrar, colocar o dinheiro no bolso, e partir para outro torneio.

Alguns analistas culpam as regras de remuneração do torneio, como discutido nesta matéria do New York Times. Basicamente, os jogadores recebem a mesma remuneração, independentemente de terem abandonado suas partidas. Por isso, em determinadas situações, os incentivos de jogadores não seriam condizentes com os interesses de organizadores do torneio, fãs do tênis, patrocinadores, donos dos direitos de transmissão etc.

Como então alinhar incentivos?

Um conceito em economia cai como uma luva nessa discussão: o problema do agente-principal. A representação mais comum, que se ensina em livros-texto e em salas de aula, envolve o gerente de uma firma (o principal) e um trabalhador (o agente). O gerente passa uma tarefa ao trabalhador, mas não tem condições de monitorá-lo o tempo todo. Não pode assim checar se ele está de fato se esforçando. Por exemplo: o gerente pede que o funcionário entre em contato com 20 clientes para agendar visitas. O funcionário pode conseguir falar com todas as 20 pessoas, mas pode também dar azar e não encontrar todo mundo. Quanto mais ele se esforça, maior a probabilidade de completar a tarefa. Entretanto, ainda que menor, a chance de fracasso existe. O problema é que, se ao fim do dia o trabalhador disser que não conseguiu contatar todo mundo, o chefe nunca saberá se ele teve azar ou simplesmente não se esforçou. O gerente tem que remunerar o esforço do empregado, mesmo sem observar o que ele está fazendo. Como? Pagando uma remuneração maior caso a tarefa seja de fato entregue. Se o pagamento fosse o mesmo, independentemente do resultado, o incentivo ao esforço seria baixo. Por que eu me esforçaria se no fim das contas vou receber a mesma coisa, e meu chefe não sabe que eu passo o dia inteiro no Facebook? Quando o esforço é correlacionado com uma remuneração esperada mais alta, o funcionário é compelido a trabalhar mais duro. Afinal, as chances de ganhar mais são mais elevadas justamente quando se trabalha com afinco. O problema é que o indivíduo pode simplesmente ter azar. Ele se esforça, mas, por motivos fora de seu controle, não consegue completar a tarefa. E acaba sendo punido por isso com um pagamento mais baixo. Esse é o custo que se paga para dar o incentivo correto quando não se observa perfeitamente as ações dos indivíduos. Podemos aplicar esse conceito em diversas outras situações, como na escola. O professor quer que seus alunos aprendam a matéria, mas não observa se eles estudam em casa. A recompensa para o aluno é a nota na prova. Se todos os alunos recebessem a mesma nota no fim das contas, qual o incentivo a estudar? Nenhum. Em uma prova bem desenhada, quem estuda mais tem maiores chances de conseguir uma boa nota. E isso dá incentivo ao estudo. Temos também o custo: alunos que se esforçam, mas que dão azar durante a prova (por ficarem nervosos, cometerem erros de conta etc.), acabam sendo prejudicados. Voltemos agora à discussão sobre Wimbledon. No caso, os jogadores da primeira rodada recebem o mesmo prêmio, independentemente de completarem a partida ou não. Nesse sentido, o incentivo de um jogador a abandonar a partida pode ser elevado, se ele perceber que não tem mais chances de vencer. É como no caso do funcionário que recebe o mesmo pagamento independentemente de completar a tarefa, ou no do aluno que consegue a mesma nota, tenha ou não estudado duro. Há algumas propostas em discussão para mitigar esse problema (veja na matéria do New York Times mencionada anteriormente). Elas buscam reduzir a remuneração do indivíduo em caso de desistência. Analogamente ao que discutimos acima, a ideia é tornar o pagamento maior caso a tarefa seja entregue. Assim, cogita-se não pagar o prêmio para quem não completa a partida. Ou permitir apenas um número máximo de desistências em um ano, e após isso não pagar o prêmio em caso de nova desistência. Como antes, indivíduos que dão azar (e que de fato se machucam) são prejudicados: além do problema físico, ficam com uma remuneração mais baixa. Será que isso estimularia o esforço, dando maior incentivo para que jogadores terminem suas partidas com dignidade mesmo com poucas chances de vitória? Uma possibilidade é que eles levem as partidas até o final, mas sem nenhum esforço. Isso provavelmente não é melhor, para o torneio, do que permitir um abandono por suposta contusão. Quem pagaria o pato seriam os atletas que se machucam de verdade e não conseguem terminar as partidas. Mas há uma chance de que funcione. Talvez a vergonha de protagonizar uma farsa em escala mundial previna essa situação. Na configuração atual, a farsa ficaria escondida sob um provável problema físico, dado que o público nunca saberá se o jogador de fato se machucou.  

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Por que tantas desistências na 1ª rodada de Wimbledon?

Roger Federer of Switzerland serves to Guido Pella of Argentina during their men's singles match on day one of the Wimbledon Tennis Championships in London, Monday, June 27, 2016. (AP Photo/Alastair Grant) Na edição de Wimbledon deste ano, um dos principais torneios de tênis do mundo, notou-se um fato preocupante: a ocorrência desproporcional de desistências, principalmente, na primeira rodada da competição. Aparentemente, a tendência vem de alguns anos para cá, mas neste ano mais de 10% das partidas masculinas da primeira rodada foram encerradas pela desistência de algum jogador. O tenista alega que está machucado ou com algum problema físico, e entrega a partida ao adversário. Isso, obviamente, não é bom para o torneio. Fãs gastam muito dinheiro para acompanhar as partidas de seus ídolos, e se deparam com jogos encerrados após uma hora ou menos. Para a TV e os patrocinadores, que pagam uma fortuna pelos direitos de transmissão e para terem seus nomes associados ao torneio, também não é um bom negócio. A recorrência das contusões tem gerado suspeitas de que várias delas não são verdadeiras. Alegar uma contusão pode ser vantajoso para em algumas situações. Se, no meio da partida, o jogador sentir que suas chances de ganhar são muito pequenas, pode fazer sentido entregar os pontos. Por que se desgastar e arrastar o jogo até o final? Pode ser melhor encerrar, colocar o dinheiro no bolso, e partir para outro torneio. Alguns analistas culpam as regras de remuneração do torneio, como discutido nesta matéria do New York Times. Basicamente, os jogadores recebem a mesma remuneração, independentemente de terem abandonado suas partidas. Por isso, em determinadas situações, os incentivos de jogadores não seriam condizentes com os interesses de organizadores do torneio, fãs do tênis, patrocinadores, donos dos direitos de transmissão etc. Como então alinhar incentivos? Um conceito em economia cai como uma luva nessa discussão: o problema do agente-principal. A representação mais comum, que se ensina em livros-texto e em salas de aula, envolve o gerente de uma firma (o principal) e um trabalhador (o agente). O gerente passa uma tarefa ao trabalhador, mas não tem condições de monitorá-lo o tempo todo. Não pode assim checar se ele está de fato se esforçando. Por exemplo: o gerente pede que o funcionário entre em contato com 20 clientes para agendar visitas. O funcionário pode conseguir falar com todas as 20 pessoas, mas pode também dar azar e não encontrar todo mundo. Quanto mais ele se esforça, maior a probabilidade de completar a tarefa. Entretanto, ainda que menor, a chance de fracasso existe. O problema é que, se ao fim do dia o trabalhador disser que não conseguiu contatar todo mundo, o chefe nunca saberá se ele teve azar ou simplesmente não se esforçou. O gerente tem que remunerar o esforço do empregado, mesmo sem observar o que ele está fazendo. Como? Pagando uma remuneração maior caso a tarefa seja de fato entregue. Se o pagamento fosse o mesmo, independentemente do resultado, o incentivo ao esforço seria baixo. Por que eu me esforçaria se no fim das contas vou receber a mesma coisa, e meu chefe não sabe que eu passo o dia inteiro no Facebook? Quando o esforço é correlacionado com uma remuneração esperada mais alta, o funcionário é compelido a trabalhar mais duro. Afinal, as chances de ganhar mais são mais elevadas justamente quando se trabalha com afinco. O problema é que o indivíduo pode simplesmente ter azar. Ele se esforça, mas, por motivos fora de seu controle, não consegue completar a tarefa. E acaba sendo punido por isso com um pagamento mais baixo. Esse é o custo que se paga para dar o incentivo correto quando não se observa perfeitamente as ações dos indivíduos. Podemos aplicar esse conceito em diversas outras situações, como na escola. O professor quer que seus alunos aprendam a matéria, mas não observa se eles estudam em casa. A recompensa para o aluno é a nota na prova. Se todos os alunos recebessem a mesma nota no fim das contas, qual o incentivo a estudar? Nenhum. Em uma prova bem desenhada, quem estuda mais tem maiores chances de conseguir uma boa nota. E isso dá incentivo ao estudo. Temos também o custo: alunos que se esforçam, mas que dão azar durante a prova (por ficarem nervosos, cometerem erros de conta etc.), acabam sendo prejudicados. Voltemos agora à discussão sobre Wimbledon. No caso, os jogadores da primeira rodada recebem o mesmo prêmio, independentemente de completarem a partida ou não. Nesse sentido, o incentivo de um jogador a abandonar a partida pode ser elevado, se ele perceber que não tem mais chances de vencer. É como no caso do funcionário que recebe o mesmo pagamento independentemente de completar a tarefa, ou no do aluno que consegue a mesma nota, tenha ou não estudado duro. Há algumas propostas em discussão para mitigar esse problema (veja na matéria do New York Times mencionada anteriormente). Elas buscam reduzir a remuneração do indivíduo em caso de desistência. Analogamente ao que discutimos acima, a ideia é tornar o pagamento maior caso a tarefa seja entregue. Assim, cogita-se não pagar o prêmio para quem não completa a partida. Ou permitir apenas um número máximo de desistências em um ano, e após isso não pagar o prêmio em caso de nova desistência. Como antes, indivíduos que dão azar (e que de fato se machucam) são prejudicados: além do problema físico, ficam com uma remuneração mais baixa. Será que isso estimularia o esforço, dando maior incentivo para que jogadores terminem suas partidas com dignidade mesmo com poucas chances de vitória? Uma possibilidade é que eles levem as partidas até o final, mas sem nenhum esforço. Isso provavelmente não é melhor, para o torneio, do que permitir um abandono por suposta contusão. Quem pagaria o pato seriam os atletas que se machucam de verdade e não conseguem terminar as partidas. Mas há uma chance de que funcione. Talvez a vergonha de protagonizar uma farsa em escala mundial previna essa situação. Na configuração atual, a farsa ficaria escondida sob um provável problema físico, dado que o público nunca saberá se o jogador de fato se machucou.   Para ficar por dentro do que rola no Por Quê?, clique aqui e assine a nossa Newsletter.
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